Não aceitava Cratesicleia
que as pessoas a vissem chorar e lamentar-se;
e caminhava majestosa e taciturna.
Seu rosto imperturbável nada demonstrava
de sua mágoa e de seu tormento.
Mas, seja como for, por um momento não aguentou;
e antes de embarcar no infortunado navio a fim de ir para Alexandria,
levou seu filho ao templo de Poseidon
e quando se encontram sós, ela o abraçou
e começou a beijá-lo, a ele "dilacerado de dor", diz
Plutarco, "e profundamente perturbado".
Contudo, sua índole forte relutou;
e, reanimada, a admirável mulher
disse a Clêomenes: "Vamos! ó rei
dos lacedemônios, para que, quando sairmos,
ninguém nos possa ver chorar
nem fazer algo indigno
de Esparta. Com efeito, isso apenas depende de nós;
os destinos apresentam-se como a divindade permite".
E embarcou no navio, indo em direção a essa "permissão".
Konstantinos Kaváfis (Tradução: Ísis Borges Fonseca)
quarta-feira, novembro 23, 2011
A Cidade
Disseste: "Irei à outra terra,irei a outro mar.
Uma outra cidade há de achar-se melhor que esta.
Cada esforço meu é uma condenação fatal;
e está meu coração - como morto - enterrado.
Meu espírito até quando ficará neste marasmo?
Para onde volte meu olhar, para qualquer lugar que atente
ruínas negras de minha vida vejo aqui,
onde tantos anos passei, e a destruí e a arruinei".
Novos lugares não encontrarás, não encontrarás outros mares.
A cidade te seguirá. Às mesmas ruas voltarás.
E nos mesmos bairros envelhecerás;
e nestas mesmas casas encanecerás.
Sempre a esta cidade chegarás. Quanto a outros lugares - não tenhas esperança -
não há navio para ti, não há caminho.
Assim como destruíste tua vida aqui
neste pequeno recanto, em toda a terra arruinaste-a.
Konstantinos Kaváfis (Tradução: Ísis Borges da Fonseca)
Uma outra cidade há de achar-se melhor que esta.
Cada esforço meu é uma condenação fatal;
e está meu coração - como morto - enterrado.
Meu espírito até quando ficará neste marasmo?
Para onde volte meu olhar, para qualquer lugar que atente
ruínas negras de minha vida vejo aqui,
onde tantos anos passei, e a destruí e a arruinei".
Novos lugares não encontrarás, não encontrarás outros mares.
A cidade te seguirá. Às mesmas ruas voltarás.
E nos mesmos bairros envelhecerás;
e nestas mesmas casas encanecerás.
Sempre a esta cidade chegarás. Quanto a outros lugares - não tenhas esperança -
não há navio para ti, não há caminho.
Assim como destruíste tua vida aqui
neste pequeno recanto, em toda a terra arruinaste-a.
Konstantinos Kaváfis (Tradução: Ísis Borges da Fonseca)
Eumênides, vv. 1-33
Pítia:
Primeiro dos Deuses nesta prece venero
Terra, primeira adivinha. Dela provém
Têmis, essa após a mãe sentava-se neste
oráculo, como contam. No terceiro sorteio,
porque ela anuiu, e não por violência,
outra Titânida filha da Terra teve assento,
Febe, e essa o doa, natalícia dádiva,
a Febo. Ele tem de Febe o cognome.
Deixou a lagoa e o penhasco délio,
aportou nas costas navegáveis de Palas
e veio a esta terra e sede do Parnaso.
Abrindo caminho os filhos de Hefesto
fazem-lhe escolta, prestam-lhe culto,
sendo amansadores de terra bravia.
Delfo, o rei timoneiro desta região,
e o povo muito honram sua chegada.
Zeus o torna pleno de divina arte
e põe quarto adivinho no trono,
e Lóxias é profeta de Zeus pai.
Por esses Deuses preludio a prece.
Palas Pronaia precede no preito.
Venero as ninfas da côncava pedra
Corícia, grata às aves, morada de Numes.
Brômio tem a área, não deslembro,
daí o Deus conduziu tropa de Bacas
tramando morte de lebre a Penteu.
Invoco águas de Plisto, poder de Posídon,
invoco o perfectivo e supremo Zeus,
depois adivinha me sento no trono.
Dêem-me hoje lograr a melhor entrada
que antes. Se há gregos presentes,
venham, segundo sorteio, como só ser.
Vaticino como Deus vai conduzindo.
Tradução: Jaa Torrano
Primeiro dos Deuses nesta prece venero
Terra, primeira adivinha. Dela provém
Têmis, essa após a mãe sentava-se neste
oráculo, como contam. No terceiro sorteio,
porque ela anuiu, e não por violência,
outra Titânida filha da Terra teve assento,
Febe, e essa o doa, natalícia dádiva,
a Febo. Ele tem de Febe o cognome.
Deixou a lagoa e o penhasco délio,
aportou nas costas navegáveis de Palas
e veio a esta terra e sede do Parnaso.
Abrindo caminho os filhos de Hefesto
fazem-lhe escolta, prestam-lhe culto,
sendo amansadores de terra bravia.
Delfo, o rei timoneiro desta região,
e o povo muito honram sua chegada.
Zeus o torna pleno de divina arte
e põe quarto adivinho no trono,
e Lóxias é profeta de Zeus pai.
Por esses Deuses preludio a prece.
Palas Pronaia precede no preito.
Venero as ninfas da côncava pedra
Corícia, grata às aves, morada de Numes.
Brômio tem a área, não deslembro,
daí o Deus conduziu tropa de Bacas
tramando morte de lebre a Penteu.
Invoco águas de Plisto, poder de Posídon,
invoco o perfectivo e supremo Zeus,
depois adivinha me sento no trono.
Dêem-me hoje lograr a melhor entrada
que antes. Se há gregos presentes,
venham, segundo sorteio, como só ser.
Vaticino como Deus vai conduzindo.
Tradução: Jaa Torrano
segunda-feira, novembro 21, 2011
Cumpre a lei, seja vil ou vil tu sejas.
Pouco pode o homem contra a externa vida.
Deixa haver a injustiça.
Não odeies nem creias.
Não tem mais reino do que a própria mente.
Essa, em que és dono, grato o Fado e os Deuses,
Governa, até à fronteira,
Onde mora a vontade.
Aí, ao menos, só por inimigos
Os grandes deuses e o Destino ostentas.
Não há dupla derrota
Da derrota e vileza.
Assim penso, e esta mórbida justiça
Com que queremos intervir nas coisas,
Expilo, como um servo
Infiel da ampla mente.
Se nem de mim posso ser dono, como
quero ser dono ou lei do que acontece
Onde me a mente e corpo
Não são mais do que coisas?
Basta-me que me baste, e o resto mova-se.
Na órbita prevista, em que até os deuses
Giram, sóis centros servos
De um movimento imenso.
Pouco pode o homem contra a externa vida.
Deixa haver a injustiça.
Não odeies nem creias.
Não tem mais reino do que a própria mente.
Essa, em que és dono, grato o Fado e os Deuses,
Governa, até à fronteira,
Onde mora a vontade.
Aí, ao menos, só por inimigos
Os grandes deuses e o Destino ostentas.
Não há dupla derrota
Da derrota e vileza.
Assim penso, e esta mórbida justiça
Com que queremos intervir nas coisas,
Expilo, como um servo
Infiel da ampla mente.
Se nem de mim posso ser dono, como
quero ser dono ou lei do que acontece
Onde me a mente e corpo
Não são mais do que coisas?
Basta-me que me baste, e o resto mova-se.
Na órbita prevista, em que até os deuses
Giram, sóis centros servos
De um movimento imenso.
quinta-feira, novembro 17, 2011
Em face dos últimos acontecimentos
Oh! sejamos pornográficos
(docemente pornográficos).
Por que seremos mais castos
que o nosso avô português?
Oh! sejamos navegantes,
bandeirantes e guerreiros
sejamos tudo que quiserem,
sobretudo pornográficos.
A tarde pode ser triste
e as mulheres podem doer
como dói um soco no olho
(pornográficos, pornográficos).
Teus amigos estão sorrindo
de tua última resolução.
Pensavam que o suicídio
fosse a última resolução.
Não compreendem, coitados,
que o melhor é ser pornográfico.
Propõe isso ao teu vizinho,
ao condutor do teu bonde,
a todas as criaturas
que são inúteis e existem,
propõe ao homem de óculos
e à mulher da trouxa de roupa.
Dize a todos: Meus irmãos,
não quereis ser pornográficos?
(docemente pornográficos).
Por que seremos mais castos
que o nosso avô português?
Oh! sejamos navegantes,
bandeirantes e guerreiros
sejamos tudo que quiserem,
sobretudo pornográficos.
A tarde pode ser triste
e as mulheres podem doer
como dói um soco no olho
(pornográficos, pornográficos).
Teus amigos estão sorrindo
de tua última resolução.
Pensavam que o suicídio
fosse a última resolução.
Não compreendem, coitados,
que o melhor é ser pornográfico.
Propõe isso ao teu vizinho,
ao condutor do teu bonde,
a todas as criaturas
que são inúteis e existem,
propõe ao homem de óculos
e à mulher da trouxa de roupa.
Dize a todos: Meus irmãos,
não quereis ser pornográficos?
terça-feira, novembro 15, 2011
quarta-feira, novembro 02, 2011
Convite triste
Meu amigo, vamos sofrer,
vamos beber, vamos ler jornal,
vamos dizer que a vida é ruim,
meu amigo, vamos sofrer.
Vamos fazer um poema,
ou qualquer outra besteira.
Fitar por exemplo uma estrela
por muito tempo, muito tempo
e dar um suspiro profundo
ou qualquer outra besteira.
Vamos beber uísque, vamos
beber cerveja preta e barata,
beber, gritar e morrer,
ou quem sabe? Beber apenas.
Vamos xingar a mulher,
que está envenenando a vida,
com seus olhos e suas mãos
e o corpo que tem dois seios
e tem um embigo também.
Meu amigo, vamos xingar
o corpo e tudo que é dele
e que nunca será alma.
Meu amigo, vamos cantar,
vamos chorar de mansinho,
e ouvir muita vitrola,
depois embriagados vamos
beber mais outros sequestros
(o olhar obsceno e a mão idiota)
depois vomitar e cair
e dormir.
Carlos Drummond de Andrade
vamos beber, vamos ler jornal,
vamos dizer que a vida é ruim,
meu amigo, vamos sofrer.
Vamos fazer um poema,
ou qualquer outra besteira.
Fitar por exemplo uma estrela
por muito tempo, muito tempo
e dar um suspiro profundo
ou qualquer outra besteira.
Vamos beber uísque, vamos
beber cerveja preta e barata,
beber, gritar e morrer,
ou quem sabe? Beber apenas.
Vamos xingar a mulher,
que está envenenando a vida,
com seus olhos e suas mãos
e o corpo que tem dois seios
e tem um embigo também.
Meu amigo, vamos xingar
o corpo e tudo que é dele
e que nunca será alma.
Meu amigo, vamos cantar,
vamos chorar de mansinho,
e ouvir muita vitrola,
depois embriagados vamos
beber mais outros sequestros
(o olhar obsceno e a mão idiota)
depois vomitar e cair
e dormir.
Carlos Drummond de Andrade
sábado, agosto 27, 2011
Se te queres matar, porque não te queres matar?
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, também me mataria...
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo de imagens externas
A que chamamos o mundo?
A cinematografia das horas representadas
Por actores de convenções e poses determinadas,
O circo pollicromo do nosso dinamismo sem fim?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente...
Talvez, acabando, comeces...
E, de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,
Não saúdes como eu a morte em literatura!
Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!
Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...
Sem ti correrá tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te...
Talvez peses mais durando, que deixando de durar...
A mágoa dos outros?...Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa...pouco te chorarão..
O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas,
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é a coisa depois da qual nada acontece aos outros...
Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
Do mistério e da falta da tua vida falada...
Depois o horror do caixão visível e material,
E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
Lamentado entre as últimas notícias dos jornais da noite,
Interseccionando a pena de teres morrido com o último crime...
E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
Muito mais morto aqui que calculas,
Mesmo que estejas vivo muito além...
Depois a retirada preta para o jazigo ou a cova,
E depois o princípio da morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia...
Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.
Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...
Se queres matar-te, mata-te...
Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência...
Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?
Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera
As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?
Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?
Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem,
Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?
És importante para ti, porque é a ti que te sentes.
És tudo para ti, porque para ti és o universo,
E o próprio universo e os outros
Satélites da tua subjectividade objectiva.
És importante para ti porque só tu és importante para ti.
E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?
Tens, como Hamlet, o pavor do desconhecido?
Mas o que é conhecido? o que é que tu conheces,
Para que chames desconhecido a qualquer coisa em especial?
Tens, como Falstaff, o amor gorduroso da vida?
Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente:
Torna-te parte carnal da terra e das coisas!
Dispersa-te, sistema físico-químico
De células nocturnamente conscientes
Pela nocturna consciência da inconsciência dos corpos,
Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências,
Pela relva e a erva da proliferação dos seres,
Pela névoa atómica das coisas,
Pelas paredes turbilhonantes
Do vácuo dinâmico do mundo...
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, também me mataria...
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo de imagens externas
A que chamamos o mundo?
A cinematografia das horas representadas
Por actores de convenções e poses determinadas,
O circo pollicromo do nosso dinamismo sem fim?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente...
Talvez, acabando, comeces...
E, de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,
Não saúdes como eu a morte em literatura!
Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!
Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...
Sem ti correrá tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te...
Talvez peses mais durando, que deixando de durar...
A mágoa dos outros?...Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa...pouco te chorarão..
O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas,
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é a coisa depois da qual nada acontece aos outros...
Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
Do mistério e da falta da tua vida falada...
Depois o horror do caixão visível e material,
E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
Lamentado entre as últimas notícias dos jornais da noite,
Interseccionando a pena de teres morrido com o último crime...
E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
Muito mais morto aqui que calculas,
Mesmo que estejas vivo muito além...
Depois a retirada preta para o jazigo ou a cova,
E depois o princípio da morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia...
Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.
Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...
Se queres matar-te, mata-te...
Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência...
Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?
Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera
As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?
Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?
Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem,
Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?
És importante para ti, porque é a ti que te sentes.
És tudo para ti, porque para ti és o universo,
E o próprio universo e os outros
Satélites da tua subjectividade objectiva.
És importante para ti porque só tu és importante para ti.
E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?
Tens, como Hamlet, o pavor do desconhecido?
Mas o que é conhecido? o que é que tu conheces,
Para que chames desconhecido a qualquer coisa em especial?
Tens, como Falstaff, o amor gorduroso da vida?
Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente:
Torna-te parte carnal da terra e das coisas!
Dispersa-te, sistema físico-químico
De células nocturnamente conscientes
Pela nocturna consciência da inconsciência dos corpos,
Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências,
Pela relva e a erva da proliferação dos seres,
Pela névoa atómica das coisas,
Pelas paredes turbilhonantes
Do vácuo dinâmico do mundo...
segunda-feira, julho 04, 2011
Íbico, fr. 286 PMG "Primavera"
Na Primavera, os marmeleiros
da Cidônia, regados pelas correntes
dos rios, lá onde das Virgens
está o puro jardim: e os pâmpanos
a crescerem sob folhagens sombrias,
rebentos de vinha. Mas para mim o amor
não descansa em nenhuma estação;
ardendo sob o relâmpago
como o Bóreas da Trácia,
lança-se de junto de Cípris com sedentas
insânias, tenebroso, desavergonhado,
e com força, de cima a baixo, sacode
o meu espírito.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia. 2006
da Cidônia, regados pelas correntes
dos rios, lá onde das Virgens
está o puro jardim: e os pâmpanos
a crescerem sob folhagens sombrias,
rebentos de vinha. Mas para mim o amor
não descansa em nenhuma estação;
ardendo sob o relâmpago
como o Bóreas da Trácia,
lança-se de junto de Cípris com sedentas
insânias, tenebroso, desavergonhado,
e com força, de cima a baixo, sacode
o meu espírito.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia. 2006
Íbico, fr. 285 PMG - "Sob pálpebras azuis"
O Amor de novo sob pálpebras azuis
com seus lânguidos olhos me contempla,
e com toda a espécie de encantos
me lança para as malhas inelutáveis da Cípris.
Na verdade tremo à sua chegada,
como o cavalo portador do jugo e arrebatador de prêmios, já velho,
que entra contrariado com o rápido carro na corrida.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia. 2006
com seus lânguidos olhos me contempla,
e com toda a espécie de encantos
me lança para as malhas inelutáveis da Cípris.
Na verdade tremo à sua chegada,
como o cavalo portador do jugo e arrebatador de prêmios, já velho,
que entra contrariado com o rápido carro na corrida.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia. 2006
Íbico - "Euríalo" (fr. 288 PMG)
Euríalo, rebento das Graças de olhos esverdeados,
favorito das...de bela cabeleira! Cípris
e Persuasão de pálpebras suaves
te nutriram entre flores de rosas.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Livros Cotovia. 2006.
favorito das...de bela cabeleira! Cípris
e Persuasão de pálpebras suaves
te nutriram entre flores de rosas.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Livros Cotovia. 2006.
Anacreonte fr.346 PMG
Mas tens além disso um temperamento
medroso, tu que dos rapazes tens o rosto mais belo!
Que te mantém firmemente em casa
é o que pensa a tua mãe,
mas tu fugiste...
para os campos cobertos de jacintos,
onde Cípris soltou do jugo
os seus cavalos.
...no meio te lançaste,
...e muitos dos cidadãos
sentiram o coração a esvoaçar.
Eu andava no pugilato com um adversário difícil,
...mas levanto a cabeça...
e devo muita gratidão...
por ter fugido do Amor...
e das suas amarras...
terríveis, por causa de Afrodite.
Que me tragam vinho,
que me tragam água a borbulhar.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006
medroso, tu que dos rapazes tens o rosto mais belo!
Que te mantém firmemente em casa
é o que pensa a tua mãe,
mas tu fugiste...
para os campos cobertos de jacintos,
onde Cípris soltou do jugo
os seus cavalos.
...no meio te lançaste,
...e muitos dos cidadãos
sentiram o coração a esvoaçar.
Eu andava no pugilato com um adversário difícil,
...mas levanto a cabeça...
e devo muita gratidão...
por ter fugido do Amor...
e das suas amarras...
terríveis, por causa de Afrodite.
Que me tragam vinho,
que me tragam água a borbulhar.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006
domingo, julho 03, 2011
Ítaca
Quando partires em viagem para Ítaca,
faz votos para que seja longo o caminho,
pleno de aventuras, pleno de conhecimentos.
Os Lestrigões e os Ciclopes,
o feroz Poseidon, não os temas,
tais seres em teu caminho jamais encontrarás,
se teu pensamento é elevado, se rara
emoção aflora teu espírito e teu corpo.
Os Lestrigões e os Ciclopes,
o irascível Poseidon, não os encontrarás,
se não os levas em tua alma,
se tua alma não os ergue diante de ti.
Faz votos de que seja longo o caminho.
Que numerosas sejam as manhãs estivais,
nas quais, com que prazer, com que alegria,
entrarás em portos vistos pela primeira vez;
pára em mercados fenícios
e adquire belas mercadorias,
nácares e corais, âmbares e ébanos
e perfumes voluptuosos de toda espécie,
e a maior quantidade de voluptuosos perfumes;
vai a numerosas cidades egípcias,
aprende, aprende sem cessar dos instruídos.
Guarda sempre Ítaca em teu pensamento.
É teu destino aí chegar.
Mas não apresses absolutamente tua viagem.
É melhor que dure muitos anos
e que, já velho, ancores na ilha,
rico com tudo que ganhaste no caminho,
sem esperar que Ítaca te dê riqueza.
Ítaca deu-te a bela viagem.
Sem ela não te porias a caminho.
Nada mais tem a dar-te.
Embora a encontres pobre, Ítaca não te enganou.
Sábio assim como te tornaste, com tanta experiência,
já dve ter compreendido o que significam as Ítacas.
Tradução de Ísis Borges da Fonseca
Fonte: FONSECA, I.B. Poemas de K.Kaváfis. São Paulo: Editora Odysseus, 2006.
Tradução de José Paulo Paes
faz votos para que seja longo o caminho,
pleno de aventuras, pleno de conhecimentos.
Os Lestrigões e os Ciclopes,
o feroz Poseidon, não os temas,
tais seres em teu caminho jamais encontrarás,
se teu pensamento é elevado, se rara
emoção aflora teu espírito e teu corpo.
Os Lestrigões e os Ciclopes,
o irascível Poseidon, não os encontrarás,
se não os levas em tua alma,
se tua alma não os ergue diante de ti.
Faz votos de que seja longo o caminho.
Que numerosas sejam as manhãs estivais,
nas quais, com que prazer, com que alegria,
entrarás em portos vistos pela primeira vez;
pára em mercados fenícios
e adquire belas mercadorias,
nácares e corais, âmbares e ébanos
e perfumes voluptuosos de toda espécie,
e a maior quantidade de voluptuosos perfumes;
vai a numerosas cidades egípcias,
aprende, aprende sem cessar dos instruídos.
Guarda sempre Ítaca em teu pensamento.
É teu destino aí chegar.
Mas não apresses absolutamente tua viagem.
É melhor que dure muitos anos
e que, já velho, ancores na ilha,
rico com tudo que ganhaste no caminho,
sem esperar que Ítaca te dê riqueza.
Ítaca deu-te a bela viagem.
Sem ela não te porias a caminho.
Nada mais tem a dar-te.
Embora a encontres pobre, Ítaca não te enganou.
Sábio assim como te tornaste, com tanta experiência,
já dve ter compreendido o que significam as Ítacas.
Tradução de Ísis Borges da Fonseca
Fonte: FONSECA, I.B. Poemas de K.Kaváfis. São Paulo: Editora Odysseus, 2006.
Tradução de José Paulo Paes
quarta-feira, junho 22, 2011
um dia
a gente ia ser homero
a obra nada menos que uma ilíada
depois
a barra pesando
dava pra ser aí um rimbaud
um ungaretti um fernando pessoa qualquer
um lorca um éluard um ginsberg
por fim
acabamos o pequeno poeta de província
que sempre fomos
por trás de tantas máscaras
que o tempo tratou como a flores
a gente ia ser homero
a obra nada menos que uma ilíada
depois
a barra pesando
dava pra ser aí um rimbaud
um ungaretti um fernando pessoa qualquer
um lorca um éluard um ginsberg
por fim
acabamos o pequeno poeta de província
que sempre fomos
por trás de tantas máscaras
que o tempo tratou como a flores
quarta-feira, junho 08, 2011
Ilíada 2.212-277: Tersites
Só Tersites crocita, corvo boquirroto,
a cabeça atulhada de frases sem ordem,
sem tino, desatinos, farpas contra os reis,
tudo para atiçar o riso dos Aqueus.
Era o homem mais feio jamais vindo a Ílion:
vesgo, manco de um pé, ombros curvos em arco,
esquálido, cabeça pontiaguda, calva
à mostra, odioso para Aquiles e Odisseu,
que a ambos insultava e que agora ao divino
Agamêmnon afronta com sua voz estrídula
(os Aqueus, contra o rei, andavam ressentidos,
o coração roído de um rancor enorme).
Ele, vociferando, vitupera o Atreide:
"Filho de Atreu, de que reclamas, que te falta?
Tendas plenas de bronze, repletas de escravas,
fina flor, que os Aqueus te dão primazia
de escolha, quando às mãos nos tomba uma cidade.
Careces de mais ouro, que um Troiano, doma-
-corcéis, te traga de Ílion, resgate do filho,
apresado por mim ou presa de outro Aqueu?
Queres outra cativa, para, a teu prazer
apartá-la, possuí-la? Não te cabe, chefe
dos filhos dos Aqueus, cumulá-los de males!
Ó bando de adamados, não Aqueus, Aquéias,
voltemos para casa com as naus. Larguemos
esse um; que coma a sós, em Tróia, os seus despojos
e veja se lhe somos úteis ou inúteis.
Esse que agora mesmo, desfeiteando Aquiles --
melhor do que ele em tudo -- rapinou-lhe o prêmio.
Ao coração de Aquiles, brando, faltou fel,
senão seria, Atreide, o teu último ultraje.
Contra o pastor-de-povos, Agamêmnon, rei,
assim falou Tersites. Odisseu divino
se acerca dele, olhar escuro, fala dura:
"Tersites, língua fátua, no arengar sonora,
segura-te, não queiras guerrear com reis.
Homem nenhum, pior que tu, chegou a Ílion
com os filhos de Atreu. É o que digo. Não ponhas
nomes de reis na boca ao proferir arengas.
Cala os insultos. Não te ocupes do retorno.
Não sabemos ao certo o fim de nossa empresa,
se os filhos dos Aqueus, bem ou mal, voltarão.
No entanto, fustigando Agamêmnon Atreide,
pastor-de-povos, eis que o culpas pelos dons
copiosos que lhe doaram destemidos Dânaos.
Arengas impropérios. Pois agora escuta:
prometo (e o cumprirei) se te pilho de novo
desvairando, a cabeça em meus ombros, ereta
eu, Odisseu, não mais terei, nem mais Telêmaco
há de ser filho meu, se não te apanho e dispo
da túnica e do manto, roupas que tu prezas,
dos panos que resguardam teu pudor, e às leves
naus te devolvo, aos trancos, humilhado, em prantos".
Falou e com o cetro deu-lhe nos costados
e ombros. Ele dobrou-se, de olho lacrimoso.
Um vermelho vergão sangrou-lhe o lombo curvo,
golpe do cetro de ouro. Então sentou-se trêmulo,
olhos em branco, moído, enxugando-se as lágrimas.
Ressentidos embora, os Aqueus gargalharam,
uns aos outros dizendo divertidamente:
"Ó deuses! Odisseu já cumpriu mil façanhas,
príncipe em bons conselhos, ardiloso em guerra.
Feito nenhum, porém, entre os Aqueus melhor
do que este realizou, calando a logorréia
ao boquirroto de ânimo arrogante. Certo,
nunca mais este insano afrontará os reis".
a cabeça atulhada de frases sem ordem,
sem tino, desatinos, farpas contra os reis,
tudo para atiçar o riso dos Aqueus.
Era o homem mais feio jamais vindo a Ílion:
vesgo, manco de um pé, ombros curvos em arco,
esquálido, cabeça pontiaguda, calva
à mostra, odioso para Aquiles e Odisseu,
que a ambos insultava e que agora ao divino
Agamêmnon afronta com sua voz estrídula
(os Aqueus, contra o rei, andavam ressentidos,
o coração roído de um rancor enorme).
Ele, vociferando, vitupera o Atreide:
"Filho de Atreu, de que reclamas, que te falta?
Tendas plenas de bronze, repletas de escravas,
fina flor, que os Aqueus te dão primazia
de escolha, quando às mãos nos tomba uma cidade.
Careces de mais ouro, que um Troiano, doma-
-corcéis, te traga de Ílion, resgate do filho,
apresado por mim ou presa de outro Aqueu?
Queres outra cativa, para, a teu prazer
apartá-la, possuí-la? Não te cabe, chefe
dos filhos dos Aqueus, cumulá-los de males!
Ó bando de adamados, não Aqueus, Aquéias,
voltemos para casa com as naus. Larguemos
esse um; que coma a sós, em Tróia, os seus despojos
e veja se lhe somos úteis ou inúteis.
Esse que agora mesmo, desfeiteando Aquiles --
melhor do que ele em tudo -- rapinou-lhe o prêmio.
Ao coração de Aquiles, brando, faltou fel,
senão seria, Atreide, o teu último ultraje.
Contra o pastor-de-povos, Agamêmnon, rei,
assim falou Tersites. Odisseu divino
se acerca dele, olhar escuro, fala dura:
"Tersites, língua fátua, no arengar sonora,
segura-te, não queiras guerrear com reis.
Homem nenhum, pior que tu, chegou a Ílion
com os filhos de Atreu. É o que digo. Não ponhas
nomes de reis na boca ao proferir arengas.
Cala os insultos. Não te ocupes do retorno.
Não sabemos ao certo o fim de nossa empresa,
se os filhos dos Aqueus, bem ou mal, voltarão.
No entanto, fustigando Agamêmnon Atreide,
pastor-de-povos, eis que o culpas pelos dons
copiosos que lhe doaram destemidos Dânaos.
Arengas impropérios. Pois agora escuta:
prometo (e o cumprirei) se te pilho de novo
desvairando, a cabeça em meus ombros, ereta
eu, Odisseu, não mais terei, nem mais Telêmaco
há de ser filho meu, se não te apanho e dispo
da túnica e do manto, roupas que tu prezas,
dos panos que resguardam teu pudor, e às leves
naus te devolvo, aos trancos, humilhado, em prantos".
Falou e com o cetro deu-lhe nos costados
e ombros. Ele dobrou-se, de olho lacrimoso.
Um vermelho vergão sangrou-lhe o lombo curvo,
golpe do cetro de ouro. Então sentou-se trêmulo,
olhos em branco, moído, enxugando-se as lágrimas.
Ressentidos embora, os Aqueus gargalharam,
uns aos outros dizendo divertidamente:
"Ó deuses! Odisseu já cumpriu mil façanhas,
príncipe em bons conselhos, ardiloso em guerra.
Feito nenhum, porém, entre os Aqueus melhor
do que este realizou, calando a logorréia
ao boquirroto de ânimo arrogante. Certo,
nunca mais este insano afrontará os reis".
domingo, maio 15, 2011
Poema de sete faces
Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.
O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
O homem atrás do óculos e do bigode.
Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.
O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
O homem atrás do óculos e do bigode.
Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.
domingo, maio 08, 2011
Bacantes, 1114-1152: Massacre de Penteu
Primeiro a mãe sacerdotisa inicia a matança
e ataca-o. Ele tira a mitra da cabeleira
para reconhecê-lo e não massacrá-lo
a triste Agave. Ele toca-lhe a face
e diz: "Sou eu, mãe, sou o teu filho
"Penteu, pariste-me no palácio de Equíon,
"tem-me piedade, ó mãe, e pelos meus
"desacertos, não massacres o teu filho!"
Ela escumava saliva e girava pupilas
reviradas, não sabia o devido saber,
possessa de Baco, e não a persuadia.
Ela agarra com as mãos o braço esquerdo
ao ir ante os flancos do de mau Nume,
e arranca-lhe o ombro, não por força,
mas o Deus lhe dava facilidade às mãos.
Ino pelo outro lado completava a ação
rasgando carnes, Autônoe e todo o bando
de Bacas atacava, o grito era uníssono?
ele a gemer quanto calhava ter fôlego,
elas a alaridear. Uma trazia um braço,
outra o pé com a mesma bota. Desnudavam-se
costelas por lacerações. Mãos sangrentas,
todas jogavam bola com a carne de Penteu.
Jaz disperso o corpo, ora em abruptas
pedras, ora na densa folhagem da floresta,
não é fácil de achar. A cabeça é prêmio
que a mãe por acaso recebe nas mãos,
presa na ponta do tirso como a de leão
montês ela a transporta pelo Citéron,
e deixa as irmãs nos coros das Loucas.
Corre alegre com a caça de maligna sorte
para dentro dos muros, evocando Báquio
o parceiro de caça, co-autor da captura,
o belo vencedor. Sua vitória será pranto.
Eu desembaraçado desta conjuntura
partire antes de Agave ir ao palácio.
A prudência e a veneração dos Deuses
é o mais belo e, creio, o mais sábio
modo de ser dos mortais que assim são.
Tradução de Jaa Torrano.
TORRANO, Jaa. Eurípides. Bacas. São Paulo: Hucitec, 1993
e ataca-o. Ele tira a mitra da cabeleira
para reconhecê-lo e não massacrá-lo
a triste Agave. Ele toca-lhe a face
e diz: "Sou eu, mãe, sou o teu filho
"Penteu, pariste-me no palácio de Equíon,
"tem-me piedade, ó mãe, e pelos meus
"desacertos, não massacres o teu filho!"
Ela escumava saliva e girava pupilas
reviradas, não sabia o devido saber,
possessa de Baco, e não a persuadia.
Ela agarra com as mãos o braço esquerdo
ao ir ante os flancos do de mau Nume,
e arranca-lhe o ombro, não por força,
mas o Deus lhe dava facilidade às mãos.
Ino pelo outro lado completava a ação
rasgando carnes, Autônoe e todo o bando
de Bacas atacava, o grito era uníssono?
ele a gemer quanto calhava ter fôlego,
elas a alaridear. Uma trazia um braço,
outra o pé com a mesma bota. Desnudavam-se
costelas por lacerações. Mãos sangrentas,
todas jogavam bola com a carne de Penteu.
Jaz disperso o corpo, ora em abruptas
pedras, ora na densa folhagem da floresta,
não é fácil de achar. A cabeça é prêmio
que a mãe por acaso recebe nas mãos,
presa na ponta do tirso como a de leão
montês ela a transporta pelo Citéron,
e deixa as irmãs nos coros das Loucas.
Corre alegre com a caça de maligna sorte
para dentro dos muros, evocando Báquio
o parceiro de caça, co-autor da captura,
o belo vencedor. Sua vitória será pranto.
Eu desembaraçado desta conjuntura
partire antes de Agave ir ao palácio.
A prudência e a veneração dos Deuses
é o mais belo e, creio, o mais sábio
modo de ser dos mortais que assim são.
Tradução de Jaa Torrano.
TORRANO, Jaa. Eurípides. Bacas. São Paulo: Hucitec, 1993
domingo, abril 17, 2011
Ilíada, XXI, 73-110 - Aquiles e Licáon
Então Licáon com uma mão tocou-lhe os joelhos em súplica,
enquanto com a outra agarrava a lança afiada e não a largava.
E falando-lhe proferiu palavras apetrechadas de asas:
"Peço-te pelos teus joelhos, ó Aquiles. Respeita-me e tem pena
de mim. Perante ti, ó tu criado por Zeus, sou suplicante venerando.
Pois foi à tua mesa que primeiro comi o cereal de Deméter,
no dia em que me tomaste no bem cuidado pomar;
depois levaste-me para longe do meu pai e dos meus amigos,
para a sacra Lemnos; lá te fiz lucrar o preço de cem bois.
Agora ganhei a liberdade por ter pago três vezes o meu preço;
e esta é a minha décima segunda aurora, desque que regressei
a Ílion depois de tudo que sofri. Agora de novo nas tuas mãos
me pôs o fado malévolo. Sou decerto detestado por Zeus pai,
que me dá novamente a ti. Para uma vida curta me deu à luz
minha mãe, Laótoa, filha de Altes, o ancião -
Altes, que é rei dos belicosos Léleges,
senhor do íngreme Pédaso no Satnioente.
Príamo desposou sua filha, assim como muitas outras;
mas dele nós dois nascemos, e tu matar-nos-ás aos dois.
Ao outro tu mataste entre os peões dianteiros,
ao divino Polidoro, com uma estocada da tua lança.
Agora ao meu encontro virá a morte. Pois não creio
que escaparei às tuas mãos, visto que nelas me pôs um deus.
Mas outra coisa te direi e tu guarda-a no teu espírito:
não me mates, pois não nasci do útero donde nasceu Heitor
que matou o teu companheiro, tão bondoso e valente.
Assim lhe falou o glorioso filho de Príamo com palavras
de súplica; mas não foi voz branda que ouviu em resposta:
"Tolo! Não me ofereças resgates nem regateies comigo.
Antes de a Pátroclo ter sobrevindo o dia do seu destino,
sempre me era mais agradável ao espírito poupar
os Troianos; e muitos levei eu vivos para vender noutro lado.
Mas agora nem um fugirá à morte, de todos os que o deus
me lançar nas mãos à frente das muralhas de Ílion:
nem um dentre todos os Troianos, muito menos os filhos de Príamo.
Não, querido amigo: morre tu também. Por que choras para nada?
E não olhas para mim e não vês como sou alto e belo?
Homem nobre é meu pai e deusa é a mãe que me gerou.
Mas também para mim virá a morte e o fado inelutável.
Chegará a aurora, a tarde ou então o meio-dia
em que em combate alguém me privará da vida,
quer atirando a lança ou disparando uma flecha."
Tradução de Frederico Lourenço
enquanto com a outra agarrava a lança afiada e não a largava.
E falando-lhe proferiu palavras apetrechadas de asas:
"Peço-te pelos teus joelhos, ó Aquiles. Respeita-me e tem pena
de mim. Perante ti, ó tu criado por Zeus, sou suplicante venerando.
Pois foi à tua mesa que primeiro comi o cereal de Deméter,
no dia em que me tomaste no bem cuidado pomar;
depois levaste-me para longe do meu pai e dos meus amigos,
para a sacra Lemnos; lá te fiz lucrar o preço de cem bois.
Agora ganhei a liberdade por ter pago três vezes o meu preço;
e esta é a minha décima segunda aurora, desque que regressei
a Ílion depois de tudo que sofri. Agora de novo nas tuas mãos
me pôs o fado malévolo. Sou decerto detestado por Zeus pai,
que me dá novamente a ti. Para uma vida curta me deu à luz
minha mãe, Laótoa, filha de Altes, o ancião -
Altes, que é rei dos belicosos Léleges,
senhor do íngreme Pédaso no Satnioente.
Príamo desposou sua filha, assim como muitas outras;
mas dele nós dois nascemos, e tu matar-nos-ás aos dois.
Ao outro tu mataste entre os peões dianteiros,
ao divino Polidoro, com uma estocada da tua lança.
Agora ao meu encontro virá a morte. Pois não creio
que escaparei às tuas mãos, visto que nelas me pôs um deus.
Mas outra coisa te direi e tu guarda-a no teu espírito:
não me mates, pois não nasci do útero donde nasceu Heitor
que matou o teu companheiro, tão bondoso e valente.
Assim lhe falou o glorioso filho de Príamo com palavras
de súplica; mas não foi voz branda que ouviu em resposta:
"Tolo! Não me ofereças resgates nem regateies comigo.
Antes de a Pátroclo ter sobrevindo o dia do seu destino,
sempre me era mais agradável ao espírito poupar
os Troianos; e muitos levei eu vivos para vender noutro lado.
Mas agora nem um fugirá à morte, de todos os que o deus
me lançar nas mãos à frente das muralhas de Ílion:
nem um dentre todos os Troianos, muito menos os filhos de Príamo.
Não, querido amigo: morre tu também. Por que choras para nada?
E não olhas para mim e não vês como sou alto e belo?
Homem nobre é meu pai e deusa é a mãe que me gerou.
Mas também para mim virá a morte e o fado inelutável.
Chegará a aurora, a tarde ou então o meio-dia
em que em combate alguém me privará da vida,
quer atirando a lança ou disparando uma flecha."
Tradução de Frederico Lourenço
Ausônio - Epigrama 1: "Sobre os seus poemas"
Há o que ler de manhã, e também de tarde; a coisas alegres
misturei sérias, para que agradem no devido tempo.
A vida não tem uma cor só, nem o poema um só
leitor; cada página tem o seu momento.
Vênus, de mitra, aprova isto: Minerva, de capacete, aquilo.
Um estóico aprecia estre trecho; um epicurista, aqueloutro.
Contanto que eu observe a norma da moral antiga,
poderá minha sóbria Musa aplaudir gracejos permitidos.
Tradução de João Pedro Mendes
In: NOVAK,Maria da Glória & NERI, Maria Luiza (org.) Poesia Lírica Latina. São Paulo: Martins Fontes, 2003
misturei sérias, para que agradem no devido tempo.
A vida não tem uma cor só, nem o poema um só
leitor; cada página tem o seu momento.
Vênus, de mitra, aprova isto: Minerva, de capacete, aquilo.
Um estóico aprecia estre trecho; um epicurista, aqueloutro.
Contanto que eu observe a norma da moral antiga,
poderá minha sóbria Musa aplaudir gracejos permitidos.
Tradução de João Pedro Mendes
In: NOVAK,Maria da Glória & NERI, Maria Luiza (org.) Poesia Lírica Latina. São Paulo: Martins Fontes, 2003
sábado, abril 16, 2011
Quero, Neera, que os teus lábios laves
Na piscina tranquila
Para que contra a tua febre e a triste
Dor que pões em viver,
Sintas a fresca e calma natureza
Da água, e reconheças
Que não têm penas nem desassossegos
As ninfas das nascentes
Nem mais soluços do que o som da água
Alegre e natural.
As nossas dores, não, Neera, vêm
Das causas naturais
Datam da alma e do infeliz fruir
Da vida com os homens.
Aprende pois, ó aprendiza jovem
Das clássicas delícias,
A não pôr mais tristeza que um sorriso
No modo como vives.
Nasceste pálida, deitando a água
Da tua vã beleza
Sobre a estólida fé das nossas mãos
Medrosas de ter gozo
Demasiado preso à desconfiança
Que vem de teu saber,
Não para essa vã mnemónica
Do futuro fatal.
Façamos vívidas grinaldas várias
De sol, flores e risos
Para ocultar o fundo fiel à Noite
Dos nossos pensamentos
Curvado já em vida sob a ideia
Do plutónico jugo
Cônscias já da lívida esperança
Do caos redivivo.
R.Reis
Na piscina tranquila
Para que contra a tua febre e a triste
Dor que pões em viver,
Sintas a fresca e calma natureza
Da água, e reconheças
Que não têm penas nem desassossegos
As ninfas das nascentes
Nem mais soluços do que o som da água
Alegre e natural.
As nossas dores, não, Neera, vêm
Das causas naturais
Datam da alma e do infeliz fruir
Da vida com os homens.
Aprende pois, ó aprendiza jovem
Das clássicas delícias,
A não pôr mais tristeza que um sorriso
No modo como vives.
Nasceste pálida, deitando a água
Da tua vã beleza
Sobre a estólida fé das nossas mãos
Medrosas de ter gozo
Demasiado preso à desconfiança
Que vem de teu saber,
Não para essa vã mnemónica
Do futuro fatal.
Façamos vívidas grinaldas várias
De sol, flores e risos
Para ocultar o fundo fiel à Noite
Dos nossos pensamentos
Curvado já em vida sob a ideia
Do plutónico jugo
Cônscias já da lívida esperança
Do caos redivivo.
R.Reis
sexta-feira, abril 15, 2011
Trabalhos e Dias 1-10 [Hino a Zeus]
Musas da Piéria, por canções glorificando,
Vinde, falai de Zeus o vosso pai hineando.
Por ele, os mortais são notos ou ignotos,
famosos ou infames, por querer de Zeus grande.
Fácil ele faz forte, fácil o forte ele enfraquece,
Facilmente o amplo amaina e o inviso acresce;
Facilmente, aplaina o torto, o altivo esvaece
Zeus que no alto freme e habita a sublime sede.
Atende-me, porque vês e ouves; apruma as sentenças,
Tu! E eu, a Perses verdades gostaria de enunciar.
[Tradução: Rafael Brunhara]
Vinde, falai de Zeus o vosso pai hineando.
Por ele, os mortais são notos ou ignotos,
famosos ou infames, por querer de Zeus grande.
Fácil ele faz forte, fácil o forte ele enfraquece,
Facilmente o amplo amaina e o inviso acresce;
Facilmente, aplaina o torto, o altivo esvaece
Zeus que no alto freme e habita a sublime sede.
Atende-me, porque vês e ouves; apruma as sentenças,
Tu! E eu, a Perses verdades gostaria de enunciar.
[Tradução: Rafael Brunhara]
quarta-feira, abril 13, 2011
O mar jaz; gemem em segredo os ventos
Em Eolo cativos;
Só com as pontas do tridente as vastas
Águas franze Neptuno
E a praia é alva e cheia de pequenos
Brilhos sob o sol claro.
Inutilmente parecemos grandes.
Nada, no alheio mundo,
Nossa vista grandeza reconhece
Ou com razão nos serve.
Se aqui de um manso mar meu fundo indício
Três ondas o apagam,
Que me fará o mar que na atra praia
Ecoa de Saturno?
Ricardo Reis
Em Eolo cativos;
Só com as pontas do tridente as vastas
Águas franze Neptuno
E a praia é alva e cheia de pequenos
Brilhos sob o sol claro.
Inutilmente parecemos grandes.
Nada, no alheio mundo,
Nossa vista grandeza reconhece
Ou com razão nos serve.
Se aqui de um manso mar meu fundo indício
Três ondas o apagam,
Que me fará o mar que na atra praia
Ecoa de Saturno?
Ricardo Reis
sábado, abril 09, 2011
Ilíada, 5, 711-868: Diomedes fere Ares
(...)
Mas Hera, braços-brancos, viu como os Aqueus
na luta cruel estavam sendo trucidados.
A Atena então profere palavras aladas:
"Filha de Zeus que porta-o-escudo, ó Infatigável!
Será vã a promessa feita a Menelau
por nós, de que, destruída Tróia bem-murada,
retornaria aos seus, se nós deixarmos Ares
enfurecer funesto. Lembremo-nos, ambas,
de nosso ímpeto bélico. Avante". Falou.
Não dissentiu a olhicerúlea, enquanto
Hera, augusta Croníade, os seus cavalos de áureo
frontal ia aprestando. Hebe ao carro adapta
rodas de bronze curvo eixo férreo, oito raios;
pinas de ouro maciço, lâminas de bronze
justas nas órbitas externas: maravilha!,
Em fina prata os cubos de rodas, girando,
de ambos os lados. Tiras feitas de ouro e prata
formam tensas o corpo do carro de dúplice
parapeito; dali sai o timão prateado,
à cuja ponta firma-se um jugo belíssimo
de ouro e peitorais aurilindos; sob o jugo
Hera os corcéis conduz, com gritos de combate.
Atena, por seu turno, filha de Zeus porta-
-escudo, deixa cair sobre o piso paterno
o peplo de polícromo bordado, urdido
por suas próprias mãos. Veste o arnês de Zeus, ajunta-
-nuvens, e cinge as armas para a lacrimosa
guerra. Põe nas espáduas a égide franjada,
pavorosa, que ostenta em coroa o Terror,
Fobos; Éris, Discórdia; Alké, Violência; Ioké,
glacial Perseguição; e a cabeça gorgônea,
monstruosa, obra de Zeus, espavento e prodígio.
A deusa coloca o elmo de cimeira dupla,
tetracórnio, dourado, com friso de heróis
de cem cidades. Sobe então ao carro flâmeo
e empunha a megalança, pesada, maciça,
com a qual, quando irada, a filha do fortíssimo
Pai dizima esquadrões de guerreiros, de heróis.
Hera fustigou rápida os corcéis. As portas
celestes por si mesmas rangeram, guardadas
pelas Horas, custódias do amplo céu urânio,
que abrem e fecham nuvens densas. Os corcéis,
picados, saem por elas. Longe dos demais
numes, Zeus, no mais alto píncaro do Olimpo
multiescarpado, senta-se. Hera, a dos braços-
-brancos, sofreia então so cavalos, dizendo:
"Pai, não te indignas vendo os torpes feitos de Ares,
que às cegas, em desordem, extermina os Gregos?
Eu sofro, enquanto a Cípria e o arquiargênteo Apolo
gzam com os demandos do demente infrene
que atiçaram. Tua cólera despertarei,
Zeus Pai, se eu castigar Ares com o rigor
devido e o afastar do campo de batalha?"
Volta-se e lhe responde Zeus ajunta-nuvens:
"Mais valerá que incites de encontro a ele Atena
predadora; ninguém melhor para puní-lo".
Disse. E assentiu a deusa braços-brancos, Hera.
Fustigou os corcéis que de bom grado voam
entre a terra e o estelário. Quanto abarca a vista,
a perder-se na bruma, de quem, de um mirante,
contempla o oceano roxo, cor-de-vinho, tanto
os cavalos das deusas num arranco avançam,
altíssonos, nitrindo. Quando aos tróicos plainos
chegaram, ao ponto aonde confluem as correntes
dos dois rios, Escamandro e Simoente, Hera, braços-
-brancos, parou o carro, soltou os cavalos
e em torno espargiu densa névoa. Do Simoente
jorrou para os cavalos pasto ambrosíaco. Elas,
as deusas, seguem, pombas tímidas no andar,
sequiosas de ajudar os Gregos. Aonde mais
- e mais forte - o combate se adensa, as duas divas
acorrem. Em redor de Diomedes, o doma-
-corcéis, se apinha a chusma - leões carnivorazes
ou javalis fortíssimos. Hera, estacando,
emite um berro, símile no vulto a Estêntor,
animoso, voz bronzirreboante, só igual
ao clamor de cinqüenta: "Que vergonha, Aqueus,
só no aspecto notáveis! Presente à refrega
o divo Aquiles, Tróico nenhum aos dardânios
portais jamais surgiu, temendo-lhe o arremesso.
Agora, é vê-los. Lutam juntos às naves côncavas!"
Disse. E pôs-se a incitar o ânimo grego e a fúria.
Atena, olhos-azuis, busca o Tideide. O príncipe,
junto aos corcéis e ao carro, amainava a ferida
que Pândaro, flecheiro, lhe fizera. O suor,
por so o largo bálteo do broquel redondo,
o afligia. Exaurido, o braço já lhe pesa;
mas afasta a correia e limpa o sangue negro-
-nuvioso. A deusa o jugo os corcéis lhe toma,
dizendo-lhe: "Ó Tideide, ao pai não se assemelha.
De pequena estatura, Tideu era um bravo.
Certa vez o proibi de lutar, de ostentar
seu brilho. Como núncio, apartado dos Gregos,
fora a Tebas, perante Cadmeios sem conta;
impus-lhe banquetear-se nos salões tranqüilo.
Mas ele, de coração fogoso, com sempre,
pôs-se a reptar os jovens cádmios e os bateu
nos vários jogos (facilmente: eu ao seu lado).
Eu, agora, te amparo e guardo e, toda zelos,
te instigo a combater os Troianos. Opresso
de fadiga ou de frio temor descorajoso,
tu não pareces filho de Tideu, flamante-
-coração, da linhagem ilustre de Eneu."
O intrépido Diomedes volta-se e responde:
"Reconheço-te, deusa, filha de Zeus, porta-
-escudo. De boa mente falo, nada oculto.
Descoragem medrosa ou tibieza não travam
meu ímpeto.Recordo apenas teu ditame:
não afrontar jamais deuses no combate;
issso ensinaste a mim e aos outros; Afrodite,
somente, poderia eu ferir com meu bronze.
Eis porque retirei-me e concitei os meus
a reunir-se aqui, junto de mim, pois notei
Ares, em meio aos Tróicos, senhoreando a guerra".
Então, olhos-azuis, a deusa Atena diz-lhe:
Ó Diomedes Tideide, meu dileto no íntimo:
não te arreceies de Ares nem de qualquer outro
imortal. Estarei ao teu lado, incitando-te.
Lança os cavalos unicascos de encontro a Ares,
acomete-o de perto, sem temer-lhe a fúria:
é um insano de má-morte, um falso, um duas caras:
a Hera e a mim, não há muito, se declarou
inimigo dos Tróicos e a favor dos Gregos.
Agora, deslembrado, junta-se aos Troianos".
Assim falando, a deusa afasta o auriga Estênelo
do carro com a mão (este salta, obediente)
e sobe à biga ao lado do árdego Diomedes.
Estala o eixo de faia sob o peso de ambos,
uma deusa terrível e um herói fortíssimo.
Palas Atena empunha o látego e o bridão
e arremessa os corcéis unicascos de encontro
a Ares. Este espoliava o enorme Perifante
o mais valente etólio, progênie de Oquésio.
Despia-o da armadura o deus sanguinolento.
Atena põe (e faz-se invisível) o escuro
elmo de Hades. Invisa, Ares só vê Diomedes.
O matador de gente-larga Perifante,
enorme, ali mesmo onde, exânime, tombou
e se atira Diomedes, cavaleiro exímio.
E quando os dois se enfrentam, cara contra cara,
Ares, por sobre o jugo e as rédeas, pronto, o bronze
desfere, rapace, ávido por desalmar
o Tideide. A deusa, olhos-azuis, com a mão
o empolga e o faz voar no vazio, lançado longe,
além da biga. Então Diomedes, voz altíssima,
arroja o pique brônzeo. Atena o endereça
aos baixos, onde aperta o cinturão do deus.
Ali o fere e punge. A pele fina rasga-lhe
e a lança extrai do ferimento. Ares, o brônzeo,
berra, com um bramido de nove ou dez mil
homens, lutando a mando do nume da guerra.
Troianos e Aqueus tremem aterrorizados,
tão grande o urro de Ares belicoso. Assim
como um vapor das nuvens, tenebroso, exala-se
em tempo de calor, quando o vento colérico
tempestua, assim viu Diomedes o brônzeo Ares
subir, a par das nuvens, para a vastidão
do urânio céu. (...)
Tradução de Haroldo de Campos
Mas Hera, braços-brancos, viu como os Aqueus
na luta cruel estavam sendo trucidados.
A Atena então profere palavras aladas:
"Filha de Zeus que porta-o-escudo, ó Infatigável!
Será vã a promessa feita a Menelau
por nós, de que, destruída Tróia bem-murada,
retornaria aos seus, se nós deixarmos Ares
enfurecer funesto. Lembremo-nos, ambas,
de nosso ímpeto bélico. Avante". Falou.
Não dissentiu a olhicerúlea, enquanto
Hera, augusta Croníade, os seus cavalos de áureo
frontal ia aprestando. Hebe ao carro adapta
rodas de bronze curvo eixo férreo, oito raios;
pinas de ouro maciço, lâminas de bronze
justas nas órbitas externas: maravilha!,
Em fina prata os cubos de rodas, girando,
de ambos os lados. Tiras feitas de ouro e prata
formam tensas o corpo do carro de dúplice
parapeito; dali sai o timão prateado,
à cuja ponta firma-se um jugo belíssimo
de ouro e peitorais aurilindos; sob o jugo
Hera os corcéis conduz, com gritos de combate.
Atena, por seu turno, filha de Zeus porta-
-escudo, deixa cair sobre o piso paterno
o peplo de polícromo bordado, urdido
por suas próprias mãos. Veste o arnês de Zeus, ajunta-
-nuvens, e cinge as armas para a lacrimosa
guerra. Põe nas espáduas a égide franjada,
pavorosa, que ostenta em coroa o Terror,
Fobos; Éris, Discórdia; Alké, Violência; Ioké,
glacial Perseguição; e a cabeça gorgônea,
monstruosa, obra de Zeus, espavento e prodígio.
A deusa coloca o elmo de cimeira dupla,
tetracórnio, dourado, com friso de heróis
de cem cidades. Sobe então ao carro flâmeo
e empunha a megalança, pesada, maciça,
com a qual, quando irada, a filha do fortíssimo
Pai dizima esquadrões de guerreiros, de heróis.
Hera fustigou rápida os corcéis. As portas
celestes por si mesmas rangeram, guardadas
pelas Horas, custódias do amplo céu urânio,
que abrem e fecham nuvens densas. Os corcéis,
picados, saem por elas. Longe dos demais
numes, Zeus, no mais alto píncaro do Olimpo
multiescarpado, senta-se. Hera, a dos braços-
-brancos, sofreia então so cavalos, dizendo:
"Pai, não te indignas vendo os torpes feitos de Ares,
que às cegas, em desordem, extermina os Gregos?
Eu sofro, enquanto a Cípria e o arquiargênteo Apolo
gzam com os demandos do demente infrene
que atiçaram. Tua cólera despertarei,
Zeus Pai, se eu castigar Ares com o rigor
devido e o afastar do campo de batalha?"
Volta-se e lhe responde Zeus ajunta-nuvens:
"Mais valerá que incites de encontro a ele Atena
predadora; ninguém melhor para puní-lo".
Disse. E assentiu a deusa braços-brancos, Hera.
Fustigou os corcéis que de bom grado voam
entre a terra e o estelário. Quanto abarca a vista,
a perder-se na bruma, de quem, de um mirante,
contempla o oceano roxo, cor-de-vinho, tanto
os cavalos das deusas num arranco avançam,
altíssonos, nitrindo. Quando aos tróicos plainos
chegaram, ao ponto aonde confluem as correntes
dos dois rios, Escamandro e Simoente, Hera, braços-
-brancos, parou o carro, soltou os cavalos
e em torno espargiu densa névoa. Do Simoente
jorrou para os cavalos pasto ambrosíaco. Elas,
as deusas, seguem, pombas tímidas no andar,
sequiosas de ajudar os Gregos. Aonde mais
- e mais forte - o combate se adensa, as duas divas
acorrem. Em redor de Diomedes, o doma-
-corcéis, se apinha a chusma - leões carnivorazes
ou javalis fortíssimos. Hera, estacando,
emite um berro, símile no vulto a Estêntor,
animoso, voz bronzirreboante, só igual
ao clamor de cinqüenta: "Que vergonha, Aqueus,
só no aspecto notáveis! Presente à refrega
o divo Aquiles, Tróico nenhum aos dardânios
portais jamais surgiu, temendo-lhe o arremesso.
Agora, é vê-los. Lutam juntos às naves côncavas!"
Disse. E pôs-se a incitar o ânimo grego e a fúria.
Atena, olhos-azuis, busca o Tideide. O príncipe,
junto aos corcéis e ao carro, amainava a ferida
que Pândaro, flecheiro, lhe fizera. O suor,
por so o largo bálteo do broquel redondo,
o afligia. Exaurido, o braço já lhe pesa;
mas afasta a correia e limpa o sangue negro-
-nuvioso. A deusa o jugo os corcéis lhe toma,
dizendo-lhe: "Ó Tideide, ao pai não se assemelha.
De pequena estatura, Tideu era um bravo.
Certa vez o proibi de lutar, de ostentar
seu brilho. Como núncio, apartado dos Gregos,
fora a Tebas, perante Cadmeios sem conta;
impus-lhe banquetear-se nos salões tranqüilo.
Mas ele, de coração fogoso, com sempre,
pôs-se a reptar os jovens cádmios e os bateu
nos vários jogos (facilmente: eu ao seu lado).
Eu, agora, te amparo e guardo e, toda zelos,
te instigo a combater os Troianos. Opresso
de fadiga ou de frio temor descorajoso,
tu não pareces filho de Tideu, flamante-
-coração, da linhagem ilustre de Eneu."
O intrépido Diomedes volta-se e responde:
"Reconheço-te, deusa, filha de Zeus, porta-
-escudo. De boa mente falo, nada oculto.
Descoragem medrosa ou tibieza não travam
meu ímpeto.Recordo apenas teu ditame:
não afrontar jamais deuses no combate;
issso ensinaste a mim e aos outros; Afrodite,
somente, poderia eu ferir com meu bronze.
Eis porque retirei-me e concitei os meus
a reunir-se aqui, junto de mim, pois notei
Ares, em meio aos Tróicos, senhoreando a guerra".
Então, olhos-azuis, a deusa Atena diz-lhe:
Ó Diomedes Tideide, meu dileto no íntimo:
não te arreceies de Ares nem de qualquer outro
imortal. Estarei ao teu lado, incitando-te.
Lança os cavalos unicascos de encontro a Ares,
acomete-o de perto, sem temer-lhe a fúria:
é um insano de má-morte, um falso, um duas caras:
a Hera e a mim, não há muito, se declarou
inimigo dos Tróicos e a favor dos Gregos.
Agora, deslembrado, junta-se aos Troianos".
Assim falando, a deusa afasta o auriga Estênelo
do carro com a mão (este salta, obediente)
e sobe à biga ao lado do árdego Diomedes.
Estala o eixo de faia sob o peso de ambos,
uma deusa terrível e um herói fortíssimo.
Palas Atena empunha o látego e o bridão
e arremessa os corcéis unicascos de encontro
a Ares. Este espoliava o enorme Perifante
o mais valente etólio, progênie de Oquésio.
Despia-o da armadura o deus sanguinolento.
Atena põe (e faz-se invisível) o escuro
elmo de Hades. Invisa, Ares só vê Diomedes.
O matador de gente-larga Perifante,
enorme, ali mesmo onde, exânime, tombou
e se atira Diomedes, cavaleiro exímio.
E quando os dois se enfrentam, cara contra cara,
Ares, por sobre o jugo e as rédeas, pronto, o bronze
desfere, rapace, ávido por desalmar
o Tideide. A deusa, olhos-azuis, com a mão
o empolga e o faz voar no vazio, lançado longe,
além da biga. Então Diomedes, voz altíssima,
arroja o pique brônzeo. Atena o endereça
aos baixos, onde aperta o cinturão do deus.
Ali o fere e punge. A pele fina rasga-lhe
e a lança extrai do ferimento. Ares, o brônzeo,
berra, com um bramido de nove ou dez mil
homens, lutando a mando do nume da guerra.
Troianos e Aqueus tremem aterrorizados,
tão grande o urro de Ares belicoso. Assim
como um vapor das nuvens, tenebroso, exala-se
em tempo de calor, quando o vento colérico
tempestua, assim viu Diomedes o brônzeo Ares
subir, a par das nuvens, para a vastidão
do urânio céu. (...)
Tradução de Haroldo de Campos
quinta-feira, março 31, 2011
Horácio, Ode II, 16
Surpreso no amplo mar Egeu, o nauta,
logo que nuvem atra esconde a lua
e estrela alguma arde no céu, aos deuses
pede descanso;
descanso pede a furibunda Trácia,
pede-o o meda de aljavas enfeitado,
Grosfo, porque, com gemas e ouro, nunca
podem comprá-lo.
Pois o ouro e o consular litor não tiram
as agitações míseras do espírito
e os cuidados que os tetos sobrevoam,
ricos de ornatos.
Vive com pouco e bem aquele a quem
pátrio saleiro esplende à mesa simples
e não lhe rouba o sono, o medo e a inveja,
sórdido vício.
Por que, assim, tanto, intrépidos, visamos,
se a vida é breve? Buscar outra terra,
sob outro sol? Mas quem, fugindo a pátria,
foge a si mesmo?
Navios de bronze o mórbido cuidado
escala; equestre esquadrões persegue,
mais rápido que o cervo, mais veloz
que Euro soprando.
Alegre no presente, que a alma odeie
os cuidados futuros, e a amargura,
adoce-a, a rir: felicidade inteira,
essa não há.
Morte precoce arrebatou Aquiles,
longa velhice consumiu Titono,
talvez o fado me conceda aquilo
que te negou.
Cercam-te cem rebanhos a mugir
de vacas sículas, relincha-te a égua,
a quadriga apta, lãs três vezes tinta
de áfrico múrice
para o teu uso tens; a mim, me deu
pequeno campo, o sopro das camenas
gregas e o dom de desprezar o vulgo,
Parca veraz.
Tradução de Bento Prado de Almeida Ferraz.
Fonte: FERRAZ, Bento Prado de Almeida; PRADO, Anna Lia Amaral de Almeida (org.) Horácio: Odes e Epodos, SP: Martins Fontes, 2003.
logo que nuvem atra esconde a lua
e estrela alguma arde no céu, aos deuses
pede descanso;
descanso pede a furibunda Trácia,
pede-o o meda de aljavas enfeitado,
Grosfo, porque, com gemas e ouro, nunca
podem comprá-lo.
Pois o ouro e o consular litor não tiram
as agitações míseras do espírito
e os cuidados que os tetos sobrevoam,
ricos de ornatos.
Vive com pouco e bem aquele a quem
pátrio saleiro esplende à mesa simples
e não lhe rouba o sono, o medo e a inveja,
sórdido vício.
Por que, assim, tanto, intrépidos, visamos,
se a vida é breve? Buscar outra terra,
sob outro sol? Mas quem, fugindo a pátria,
foge a si mesmo?
Navios de bronze o mórbido cuidado
escala; equestre esquadrões persegue,
mais rápido que o cervo, mais veloz
que Euro soprando.
Alegre no presente, que a alma odeie
os cuidados futuros, e a amargura,
adoce-a, a rir: felicidade inteira,
essa não há.
Morte precoce arrebatou Aquiles,
longa velhice consumiu Titono,
talvez o fado me conceda aquilo
que te negou.
Cercam-te cem rebanhos a mugir
de vacas sículas, relincha-te a égua,
a quadriga apta, lãs três vezes tinta
de áfrico múrice
para o teu uso tens; a mim, me deu
pequeno campo, o sopro das camenas
gregas e o dom de desprezar o vulgo,
Parca veraz.
Tradução de Bento Prado de Almeida Ferraz.
Fonte: FERRAZ, Bento Prado de Almeida; PRADO, Anna Lia Amaral de Almeida (org.) Horácio: Odes e Epodos, SP: Martins Fontes, 2003.
sexta-feira, março 18, 2011
Anacreonte
Fragmento 391 PMG
Mas agora a grinalda da cidade foi destruída.
Fragmento 394 PMG
Graciosa andorinha de voz tão doce!
Fragmento 396 PMG
Traz água e traz vinho, ó rapaz! Traz-me também coroas
de flores. Vai buscá-las: quero andar ao murro com o Amor.
Fragmento 398 PMG
Os dados do Amor
são a loucura e a algazarra.
Fragmento 407 PMG
Oferece-me, meu querido,
as tuas coxas tão esbeltas.
Fragmento 413 PMG
Como um ferreiro de novo o Amor me golpeou
com um grande machado e banhou-me na corrente invernosa.
Fragmento 414 PMG
Cortaste a flor perfeita do teu cabelo macio.
Fragmento 428 PMG
De novo amo e não amo,
estou doido e não estou doido.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006
Mas agora a grinalda da cidade foi destruída.
Fragmento 394 PMG
Graciosa andorinha de voz tão doce!
Fragmento 396 PMG
Traz água e traz vinho, ó rapaz! Traz-me também coroas
de flores. Vai buscá-las: quero andar ao murro com o Amor.
Fragmento 398 PMG
Os dados do Amor
são a loucura e a algazarra.
Fragmento 407 PMG
Oferece-me, meu querido,
as tuas coxas tão esbeltas.
Fragmento 413 PMG
Como um ferreiro de novo o Amor me golpeou
com um grande machado e banhou-me na corrente invernosa.
Fragmento 414 PMG
Cortaste a flor perfeita do teu cabelo macio.
Fragmento 428 PMG
De novo amo e não amo,
estou doido e não estou doido.
Tradução de Frederico Lourenço
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006
Íbico, fragmento 282a - "Arte Poética"
...destruíram de Príamo Dardânida
a grande, famosa e venturosa cidade,
vindos de Argos, devido
à deliberações do grande Zeus,
por causa da beleza da loira Helena
suportando conflitos muito cantados
na guerra lacrimosa;
e a desgraça montou Pérgamo miseranda,
devido a Cípris dos dourados cabelos.
Mas agora não é meu desejo cantar
Páris, traidor do anfitrião que o recebeu,
nem Cassandra dos finos tornozelos,
nem todos os outros filhos de Príamo,
nem o dia inominável da tomada
da alta Tróia; nem narrarei
o altivo valor dos heróis,
trazidos em côncavas naus
de muitas cavilhas como flagelo
para Tróia, heróis excelentes.
Comandava-os o poderoso rei
Agamémnon, da linhagem de Plístenes,
condutor de homens, belo filho de Atreu.
Nestes temas as sábias Musas
do Hélicon talvez embarcariam,
mas nenhum homem mortal
...conseguiria dizer tudo:
quantas naus de Áulis
através do mar Egeu desde Argos
vieram até Tróia
apascentadora de cavalos,
com homens vestidos de bronze a bordo,
filhos dos Aqueus; entre os primeiros,
com a sua lança, Aquiles de pés velozes,
e o potente Ájax Telamónio...
...do fogo
....o mais belo homem de Argos...
...
...que a náiade de cinta dourada,
Hílis, deu à luz; a este, Troianos e Dânaos
comparavam Troilo,
como ouro três vezes trabalhado
a uma liga de bronze,
pois consideravam-no
muito parecido na beleza.
Estes têm a beleza para sempre.
Também tu, ó Polícrates, terás renome imorredouro,
graças ao meu canto e à minha fama.
Tradução de Frederico Lourenço.
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006.
a grande, famosa e venturosa cidade,
vindos de Argos, devido
à deliberações do grande Zeus,
por causa da beleza da loira Helena
suportando conflitos muito cantados
na guerra lacrimosa;
e a desgraça montou Pérgamo miseranda,
devido a Cípris dos dourados cabelos.
Mas agora não é meu desejo cantar
Páris, traidor do anfitrião que o recebeu,
nem Cassandra dos finos tornozelos,
nem todos os outros filhos de Príamo,
nem o dia inominável da tomada
da alta Tróia; nem narrarei
o altivo valor dos heróis,
trazidos em côncavas naus
de muitas cavilhas como flagelo
para Tróia, heróis excelentes.
Comandava-os o poderoso rei
Agamémnon, da linhagem de Plístenes,
condutor de homens, belo filho de Atreu.
Nestes temas as sábias Musas
do Hélicon talvez embarcariam,
mas nenhum homem mortal
...conseguiria dizer tudo:
quantas naus de Áulis
através do mar Egeu desde Argos
vieram até Tróia
apascentadora de cavalos,
com homens vestidos de bronze a bordo,
filhos dos Aqueus; entre os primeiros,
com a sua lança, Aquiles de pés velozes,
e o potente Ájax Telamónio...
...do fogo
....o mais belo homem de Argos...
...
...que a náiade de cinta dourada,
Hílis, deu à luz; a este, Troianos e Dânaos
comparavam Troilo,
como ouro três vezes trabalhado
a uma liga de bronze,
pois consideravam-no
muito parecido na beleza.
Estes têm a beleza para sempre.
Também tu, ó Polícrates, terás renome imorredouro,
graças ao meu canto e à minha fama.
Tradução de Frederico Lourenço.
Fonte: LOURENÇO, F. Poesia grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006.
Semônides, Fr.1 W - "A Condição Humana"
Ó rapaz, é Zeus tonitruante que detém o desfecho
de tudo quanto existe e tudo dispõe como quer.
Não há inteligência nos homens, mas vivemos
efêmeros como gado, sem sabermos
como o deus terminará cada coisa.
Porém a esperança e a credulidade
alimentam-nos a vontade do impossível.
Uns esperam que venha o dia, outros as estações.
Não há ninguém que não julgue chegar ao ano
seguinte, amigo da riqueza e da prosperidade.
Mas a velhice, nada invejável, apanha um homem
antes de chegar à sua meta; a outros mortais
destroem as doenças miseráveis; e Hades envia
outros para debaixo da negrra terra, mortos por Ares.
Outros agitados na tempestade marítima
e nas ondas numerosas do mar purpúreo
morrem, quando não conseguem sustento em terra.
Outros ainda atam uma corda ao pescoço em desgraçado
destino e deixam por sua vontade a luz do sol.
Assim, nada existe sem misérias, mas incontáveis
desgraças e sofrimentos inesperados existem
para os mortais. Mas se eu tivesse o poder de persuadir,
não estaríamos apaixonados pelas desgraças,
mas daríamos cabo do coração com dores amargas.
Tradução de Frederico Lourenço
FONTE: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006.
de tudo quanto existe e tudo dispõe como quer.
Não há inteligência nos homens, mas vivemos
efêmeros como gado, sem sabermos
como o deus terminará cada coisa.
Porém a esperança e a credulidade
alimentam-nos a vontade do impossível.
Uns esperam que venha o dia, outros as estações.
Não há ninguém que não julgue chegar ao ano
seguinte, amigo da riqueza e da prosperidade.
Mas a velhice, nada invejável, apanha um homem
antes de chegar à sua meta; a outros mortais
destroem as doenças miseráveis; e Hades envia
outros para debaixo da negrra terra, mortos por Ares.
Outros agitados na tempestade marítima
e nas ondas numerosas do mar purpúreo
morrem, quando não conseguem sustento em terra.
Outros ainda atam uma corda ao pescoço em desgraçado
destino e deixam por sua vontade a luz do sol.
Assim, nada existe sem misérias, mas incontáveis
desgraças e sofrimentos inesperados existem
para os mortais. Mas se eu tivesse o poder de persuadir,
não estaríamos apaixonados pelas desgraças,
mas daríamos cabo do coração com dores amargas.
Tradução de Frederico Lourenço
FONTE: LOURENÇO, F. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Lisboa: Cotovia, 2006.
sábado, fevereiro 26, 2011
O Prazo de Nero
Não se perturbou Nero quando ouviu
do Oráculo de Delfos a profecia:
"Que tema os setenta e três anos".
Tinha ainda tempo para aproveitar.
Tem trinta anos. Bastante longo
é o prazo que o deus lhe dá
para preocupar-se com os riscos futuros.
Agora, vai retornar a Roma um pouco fatigado,
mas maravilhosamente cansado desta viagem,
que foi sempre dias de prazer -
nos teatros, nos jardins, nos ginásios ...
Noitinhas das cidades da Acaia ...
Ah! a volúpia dos corpos nus, sobretudo ...
Eis aí Nero. E na Espanha Galba
secretamente congrega sua tropa e a exercita,
o velho de setenta e três anos.
K.Kaváfis
Fonte: Poemas de K.Kaváfis; Tradução de Ísis B. da Fonseca. São Paulo: Odysseus, 2007.
do Oráculo de Delfos a profecia:
"Que tema os setenta e três anos".
Tinha ainda tempo para aproveitar.
Tem trinta anos. Bastante longo
é o prazo que o deus lhe dá
para preocupar-se com os riscos futuros.
Agora, vai retornar a Roma um pouco fatigado,
mas maravilhosamente cansado desta viagem,
que foi sempre dias de prazer -
nos teatros, nos jardins, nos ginásios ...
Noitinhas das cidades da Acaia ...
Ah! a volúpia dos corpos nus, sobretudo ...
Eis aí Nero. E na Espanha Galba
secretamente congrega sua tropa e a exercita,
o velho de setenta e três anos.
K.Kaváfis
Fonte: Poemas de K.Kaváfis; Tradução de Ísis B. da Fonseca. São Paulo: Odysseus, 2007.
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