sábado, outubro 24, 2015

Ezra Pound - Cantares, 81 - Fragmento. Tradução de Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos

O que amas de verdade permanece,
o resto é escória
O que amas de verdade não te será arrancado
O que amas de verdade é tua herança verdadeira
Mundo de quem, meu ou deles
ou não é de ninguém?
Veio o visível primeiro, depois o palpável
Elísio, ainda que fosse nas câmaras do inferno,
O que amas de verdade é tua herança verdadeira
O que amas de verdade não te será arrancado

A formiga é um centauro em seu mundo de dragões.
Abaixo tua vaidade, nem coragem
Nem ordem, nem graça são obras do homem,
Abaixo tua vaidade, eu digo abaixo.
Aprende com o mundo verde o teu lugar
Na escala da invenção ou arte verdadeira,
Abaixo tua vaidade,
Paquin, abaixo!
O elmo verde superou tua elegância.
"Domina-te e outros te suportarão"
Abaixo tua vaidade
Tu és um cão surrado e largado ao granizo,
Uma pega inchada sob o sol instável,
Metade branca, metade negra
E confundes a asa com a cauda
Abaixo tua vaidade
Que mesquinhos teus ódios
Nutridos na mentira,
Abaixo tua vaidade,
Ávido em destruir, avaro em caridade,
Abaixo tua vaidade,
Eu digo abaixo.

Mas ter feito em lugar de fazer
isto não é vaidade
Ter, com decência, batido
Para que um Blunt abrisse
Ter colhido no ar a tradição mais viva
ou num belo olho antigo a flama inconquistada
Isto não é vaidade.
Aqui, o erro todo consiste em não ter feito.
Todo: na timidez que vacilou.

[Tradução de Augusto de Campos, Haroldo de Campos, Décio Pignatari in Ezra Pound, Poesia. Edição do centenário do nascimento de Ezra Pound. 2 ed. São Paulo: Hucitec, 1985]

What thou lovest well remains,
the rest is dross
What thou lov’st well shall not be reft from thee
What thou lov’st well is thy true heritage
Whose world, or mine or theirs
or is it of none?
First came the seen, then thus the palpable
Elysium, though it were in the halls of hell,
What thou lovest well is thy true heritage
What thou lov’st well shall not be reft from thee

The ant’s a centaur in his dragon world.
Pull down thy vanity, it is not man
Made courage, or made order, or made grace,
Pull down thy vanity, I say pull down.
Learn of the green world what can be thy place
In scaled invention or true artistry,
Pull down thy vanity,
Paquin pull down!
The green casque has outdone your elegance.

“Master thyself, then others shall thee beare”
Pull down thy vanity
Thou art a beaten dog beneath the hail,
A swollen magpie in a fitful sun,
Half black half white
Nor knowst’ou wing from tail
Pull down thy vanity
How mean thy hates
Fostered in falsity,
Pull down thy vanity,
Rathe to destroy, niggard in charity,
Pull down thy vanity,
I say pull down.

But to have done instead of not doing
this is not vanity
To have, with decency, knocked
That a Blunt should open
To have gathered from the air a live tradition
or from a fine old eye the unconquered flame
This is not vanity.
Here error is all in the not done,
all in the diffidence that faltered . . .

terça-feira, outubro 20, 2015

Hino Órfico 70: Eumênides

[Εὐμενίδων], θυμίαμα ἀρώματα.

Κλῦτέ μου, Εὐμενίδες μεγαλώνυμοι, εὔφρονι βουλῆι,
ἁγναὶ θυγατέρες μεγάλοιο Διὸς χθονίοιο
Φερσεφόνης τ', ἐρατῆς κούρης καλλιπλοκάμοιο,
αἳ πάντων καθορᾶτε βίον θνητῶν ἀσεβούντων,
τῶν ἀδίκων τιμωροί, ἐφεστηκυῖαι ἀνάγκηι, (5)
κυανόχρωτες ἄνασσαι, ἀπαστράπτουσαι ἀπ' ὄσσων
δεινὴν ἀνταυγῆ φάεος σαρκοφθόρον αἴγλην·
ἀίδιοι, φοβερῶπες, ἀπόστροφοι, αὐτοκράτειραι,
λυσιμελεῖς οἴστρωι, βλοσυραί, νύχιαι, † πολύποτμοι,
νυκτέριαι κοῦραι, ὀφιοπλόκαμοι, φοβερῶπες· (10)
ὑμᾶς κικλήσκω γνώμαις ὁσίαισι πελάζειν.

[Das Eumênides], fumigação: ervas aromáticas

Ouvi-me, Eumênides de magno nome, com benévolo desígnio,
puras filhas do grande Zeus ctônio
e de Perséfone, a amável donzela de belos cachos;
vós contemplais a vida de todos os ímpios mortais,
vingadoras de injustiças, investidas por necessidade, (5)
soberanas de pele escura, de vossos olhos lampeja
terrível radiante raio de luz, rompendo a carne;
perpétuas de olhar temível, revoltantes rainhas
solta-membros,com vosso aguilhão; hirsutas, multifatídicas
noturnas donzelas com cabelos de serpente e olhar temível; (10)
eu vos invoco com sagrados pensamentos: aproximai-vos!

[Tradução: Rafael Brunhara]

domingo, outubro 18, 2015

Horácio - Epodo XIII Leitura e Tradução de Robert de Brose

https://soundcloud.com/robert_de_brose/horace-epode-xiii

Horrida tempestas caelum contraxit et imbres
nivesque deducunt Iovem; nunc mare, nunc siluae
Threicio Aquilone sonant. rapiamus, amici,
occasionem de die, dumque virent genua
et decet, obdūctā solvatur fronte senectus.
tu vīna Torquato move consule pressa meo.
cetera mitte loqui: deus haec fortasse benigna
reducet in sedem vice. nunc et Achaemenio
perfundī nardō iuvat et fidē Cyllenaea
levāre diris pectora | sollicitudinibus,
nobilis ut grandī cecinit Centaurus alumno:
'invicte, mortalis deā nate puer Thetide,
te mānet Assaracī tellus, quam frigida parvī
findunt Scamandrī flumina lubricus et Simois,
unde tibi reditum certo subtemine Parcae
rupere, nec mater domum caerula te revehet.
illic omne malum vino cantuque lēvātō,
deformis aegrimoniae dulcibus adloquiis.'


Horrível tempestade contraiu o céu e chuvas
e neves depõem Jove: agora o mar, agora as selvas
com o Trácio Aquilão ressoam. Colhamos, amigos,
a ocasião do dia, enquanto vicejam as pernas
e convém, contraída à fronte dissolva-se a velhice.
Tu as uvas traz, prensadas no consulado do meu Torquato,
do resto evita falar, um deus talvez, os invés disso,
outras benesses reponha em seu lugar. Agora Aquemênio
com o nardo ajuda o ungir-se, e com a fida cilênia,
o aliviar do peito as diras preocupações,
assim nobre cantou o Centauro ao grande aluno:
“Invicto entre os mortais, filho nascido da deusa Tétis,
espera-te a terra de Assáraco, que as frígidas águas
do raso Escamândro dividem e o célere Símois,
onde o teu retorno, com certo fiame, as Parcas
romperam, nem a mãe cerúlea à casa te levará.
Lá todo o mal com o vinho, com o canto, alivia,
doces consolos de uma deformante tristeza.

[Tradução: Robert de Brose]

Hino Órfico 69: Erínias

[Ἐρινύων], θυμίαμα στύρακα καὶ μάνναν.

Κλῦτε, θεαὶ πάντιμοι, ἐρίβρομοι, εὐάστειραι,
Τισιφόνη τε καὶ Ἀλληκτὼ καὶ δῖα Μέγαιρα·
νυκτέριαι, μυχίοις ὑπὸ κεύθεσιν οἰκί' ἔχουσαι
ἄντρωι ἐν ἠερόεντι παρὰ Στυγὸς ἱερὸν ὕδωρ,
οὐχ ὁσίαις βουλαῖσι βροτῶν κεκοτημέναι αἰεί, (5)
λυσσήρεις, ἀγέρωχοι, ἐπευάζουσαι ἀνάγκαις,
θηρόπεπλοι, τιμωροί, ἐρισθενέες, βαρυαλγεῖς,
Ἀίδεω χθόνιαι, φοβεραὶ κόραι, αἰολόμορφοι,
ἠέριαι, ἀφανεῖς, ὠκυδρόμοι ὥστε νόημα·
οὔτε γὰρ ἠελίου ταχιναὶ φλόγες οὔτε σελήνης (10)
καὶ σοφίης ἀρετῆς τε καὶ ἐργασίμου θρασύτητος
† εὔχαρι οὔτε βίου λιπαρᾶς περικαλλέος ἥβης
ὑμῶν χωρὶς ἐγείρει ἐυφροσύνας βιότοιο·
ἀλλ' αἰεὶ θνητῶν πάντων ἐπ' ἀπείρονα φῦλα
ὄμμα Δίκης ἐφορᾶτε, δικασπόλοι αἰὲν ἐοῦσαι. (15)
ἀλλά, θεαὶ Μοῖραι, ὀφιοπλόκαμοι, πολύμορφοι,
πραΰνοον μετάθεσθε βίου μαλακόφρονα δόξαν.

[Das Erínias] Fumigação: estoraque e incenso

Ouvi, Deusas de todas as honras, bradando evoés
em amplo clamor, Tisífone e Alecto e divina Megera:
noturnas com lares nos profundos recessos da terra,
em nevoenta gruta junto às sacras águas do Estige,
com rancor de planos não pios dos mortais sempre,
sois Deusas altivas, fúrias enlouquecidas a clamar o devido,
fortíssimas vingadoras em vestes selvagens, de pesado sofrer,
subtérreas terríveis donzelas do Hades de mutante forma:
aéreas e invisíveis, correndo rápido como o pensamento!
Nem os raios velozes do sol ou da lua (10)
nem sabedoria, virtude, ou alegria em arrojados trabalhos
nem a parte mais rica da vida, a belíssima juventude,
despertam a felicidade de viver, se vos ausentais:
sim a todos os infinitos povos mortais sempre
mirais com olho da Justiça, juízas sempre vivas! (15),
Vamos, Deusas Moiras multiformes, cabelos de serpente:
tornai a mente branda e leve o coração nos pensamentos da vida.

[Tradução: Rafael Brunhara]

sábado, outubro 03, 2015

Antologia Palatina XII - A Musa Pueril

12.16 - Estratão
Não sejas recatado, Filócrates: o Deus Amor
basta p'ra calcar aos pés nosso coração.
Beija-me, hoje; chegará o dia em que tu
pedirás também esse favor de outro.

12.18 - Alfeu de Mitilene
Infeliz, quem vive sem amor; Sem o desejo,
não é fácil agir ou falar;
Por exemplo: sou muito lento, mas se vejo
Xenófilo, voo mais rápido que a luz.
Por isso, digo: não fujas do doce amor, persiga-o!
Amor é a pedra de toque da alma.

12.20 - Júlio Leônidas
Zeus compraz-se outra vez em banquetes Etíopes,
ou como ouro esgueira-se no leito de Dânae.
Pois seria um espanto se, ao ver Periandro, não raptasse da terra
o belo. Será que o Deus não mais ama meninos?

[Tradução: Rafael Brunhara]