quinta-feira, novembro 21, 2013

As Mulheres na Assembleia, vv. 952-1001

As Mulheres na Assembleia ou, ainda, As Assembleístas (Ekklesiazusai) é uma das peças mais tardias de Aristófanes, marcando uma transição da comédia antiga para a comédia nova. Na peça, as mulheres tomam a assembleia e instauram uma nova lei: se um homem quisesse fazer amor com sua amante, deveria antes fazer amor com uma velha. No trecho abaixo, vemos uma velha se aproveitando desta nova lei:

[Moça]:
Vem aqui, vem aqui,
meu amado, p'ra mim!
vem e dorme comigo!
Trata de vir à noite,
que uma paixão me agita,
intensa, por teus cachos.
Absurdo o desejo dentro de mim,
estou dilacerada...
Alivia-me, suplico-te, Eros!
Faça-o vir
ao meu leito!

[Moço]:

Vem aqui, vem aqui,
minha amada,também!
Corre, abre essa porta:
ou me jogo no chão e fico lá.
Quero acariciar
o teu seio, tua bunda...
Cípris, por que me deixas louco por ela?
Alivia-me, suplico-te, Eros!
Faça-a vir
ao meu leito!

Mas para o meu anseio, modestas são
tais palavras. Mais amada, suplico,
abre a porta, me abraça!
pois é por ti que eu sofro.
joia de ouro, meu mimo, flor da Cípris,
abelha das Musas,filha das Graças,ó face de volúpias...
abre a porta, me abraça!
pois é por ti que eu sofro.

[Velha]:

Olá! Tu, por que bates? Me procuras?

[Moço]:

Quem, eu?

[Velha]

Sim, tu arrebentavas a porta.

[Moço]:
Preferiria morrer...

[Velha]:
E o que você busca aqui co' uma tocha?

[Moço]
eu busco alguém de Punhetópolis*...

[Velha]
Heim?

[Moço]
Não sou o  Tifodias** que tu procuras.

[Velha]
És sim, por Afrodite! Queiras tu ou não...


[Moço]
Não levamos as com mais de sessenta
agora, não. Deixamos p'ra depois.
Vamos antes para aquelas na casa dos vinte.

[Velha]
Isso no governo anterior,docinho.
mas agora, tem de nos levar antes.

[Moço]
Eu levo se quiser! Essa é a regra!

[Velha]
Tu deixas de jantar, se houver regra?

[Moço]
Não sei do que é que tu estás falando.
Tenho que bater nesta porta aqui.

[Velha]
Só depois de bateres na minha porta!

[Moço]
Mas não estou pedindo roupa velha.

[Velha]
Sei que me queres; só estás assustado
porque me achaste à porta. Vem,me beija!

[Moço]
Ei! Não! Teu namorado me apavora!

[Velha]
Quem?

[Moço]
Teu namorado, o melhor dos pintores.

[Velha]
E quem é esse aí?

[Moço]

O pintor de vasos funerários.

[Velha]
sei bem o que tu queres...

[Moço]
Também sei o que tu queres! Por Zeus!

[Velha]
Por Afrodite, de quem sou devota,
nunca vou deixar que vás embora!

[Moço]
Endoidaste, vovó!

[Velha]
Tolinho! Te levarei p'ra minha cama!



*No original, anaflystion; tratava-se de um demo em Atenas, mas também é um jogo de palavras feito por Aristófanes com o verbo anafláo.
** No original, um nome próprio: Sebinos; outro jogo de palavras com sentido obsceno, dessa vez com o verbo binéo, que traduzo por "Tifodias"(agradeço ao Tadeu Andrade pela sugestão, compartilhada de sua tradução ainda inéditas das Rãs).


δεῦρο δή, δεῦρο δή,
φίλον ἐμόν, δεῦρό μοι
πρόσελθε καὶ ξύνευνέ μοι
τὴν εὐφρόνην ὅπως ἔσει.
πάνυ γάρ τις ἔρως με δονεῖ
τῶνδε τῶν σῶν βοστρύχων. (955)
ἄτοπος δ' ἔγκειταί μοί τις πόθος,
ὅς με διακναίσας ἔχει.
μέθες, ἱκνοῦμαί σ', Ἔρως,
καὶ ποίησον τόνδ' ἐς εὐνὴν
τὴν ἐμὴν ἱκέσθαι.


{Νε} δεῦρο δή, δεῦρο δή, (960)
φίλον <ἐμόν>, καὶ σύ μοι
καταδραμοῦσα τὴν θύραν
ἄνοιξον τήνδ'· εἰ δὲ μή, καταπεσὼν κείσομαι.
ἀλλ' ἐν τῷ σῷ βούλομαι κόλπῳ
965
πληκτίζεσθαι μετὰ τῆς σῆς πυγῆς.
Κύπρι, τί μ' ἐκμαίνεις ἐπὶ ταύτῃ;
μέθες, ἱκνοῦμαί σ', Ἔρως,
καὶ ποίησον τήνδ' ἐς εὐνὴν
τὴν ἐμὴν ἱκέσθαι.

καὶ ταῦτα μέντοι μετρίως πρὸς τὴν ἐμὴν ἀνάγκην
εἰρημέν' ἐστίν. σὺ δέ μοι, φίλτατον, ὢ ἱκετεύω,
ἄνοιξον, ἀσπάζου με.
διά τοι σὲ πόνους ἔχω.
ὦ χρυσοδαίδαλτον ἐμὸν μέλημα, Κύπριδος ἔρνος,
μέλιττα Μούσης, Χαρίτων θρέμμα, Τρυφῆς πρόσωπον,
ἄνοιξον, ἀσπάζου με.
διά τοι σὲ πόνους ἔχω. (975)


{Γρ.} οὗτος, τί κόπτεις; μῶν ἐμὲ ζητεῖς; {Νεας9.} πόθεν;
{Γρ.} καὶ τὴν θύραν γ' ἤραττες. {Νε.} ἀποθάνοιμ' ἄρα.
{Γρ.} τοῦ δαὶ δεόμενος δᾷδ' ἔχων ἐλήλυθας;
{Νε.} Ἀναφλύστιον ζητῶν τιν' ἄνθρωπον. {Γρ. α9} τίνα;
{Νε.} οὐ τὸν Σεβῖνον, ὃν σὺ προσδοκᾷς ἴσως.
{Γρ.} νὴ τὴν Ἀφροδίτην, ἤν τε βούλῃ γ' ἤν τε μή.
{Νε.} ἀλλ' οὐχὶ νυνὶ τὰς ὑπερεξηκοντέτεις
εἰσάγομεν, ἀλλ' εἰσαῦθις ἀναβεβλήμεθα.
τὰς ἐντὸς εἴκοσιν γὰρ ἐκδικάζομεν.
{Γρ.} ἐπὶ τῆς προτέρας ἀρχῆς γε ταῦτ' ἦν, ὦ γλύκων· (985)
νυνὶ δὲ πρῶτον εἰσάγειν ἡμᾶς δοκεῖ.
{Νε.} τῷ βουλομένῳ γε κατὰ τὸν ἐν πεττοῖς νόμον.
{Γρ.} ἀλλ' οὐδὲ δειπνεῖς κατὰ τὸν ἐν πεττοῖς νόμον.
{Νε.} οὐκ οἶδ' ὅ τι λέγεις· τηνδεδί μοι κρουστέον.
{Γρ.} ὅταν γε κρούσῃς τὴν ἐμὴν πρῶτον θύραν. (990)
{Νε.} ἀλλ' οὐχὶ νυνὶ κρησέραν αἰτούμεθα.
{Γρ.} οἶδ' ὅτι φιλοῦμαι· νῦν δὲ θαυμάζεις ὅτι
θύρασί μ' ηὗρες. ἀλλὰ πρόσαγε τὸ στόμα.
{Νε.} ἀλλ', ὦ μέλ' ὀρρωδῶ τὸν ἐραστήν σου. {Γρ.} τίνα;

{Νε.} τὸν τῶν γραφέων ἄριστον. {Γρ. α9} οὗτος δ' ἐστὶ τίς;
{Νε.} ὃς τοῖς νεκροῖσι ζωγραφεῖ τὰς ληκύθους.
ἀλλ' ἄπιθ', ὅπως μή σ' ἐπὶ θύραισιν ὄψεται.
{Γρ.} οἶδ', οἶδ' ὅ τι βούλει. {Νεας9.} καὶ γὰρ ἐγώ σε, νὴ Δία.
{Γρ.} μὰ τὴν Ἀφροδίτην, ἥ μ' ἔλαχε κληρουμένη,
μὴ 'γώ σ' ἀφήσω. {Νεας9.} παραφρονεῖς, ὦ γρᾴδιον. (1000)
{Γρ.} ληρεῖς· ἐγὼ δ' ἄξω σ' ἐπὶ τἀμὰ στρώματα.

[Tradução: Rafael Brunhara]





terça-feira, novembro 19, 2013

Estratão - Musa Pueril (Antologia Palatina XII) I, II, IV, VI


I

Zeus é mais indicado a presidir o canto do poeta do que as tradicionais Musas do monte Hélicon, já que o deus, tendo se apaixonado por Ganimedes como conta o mito, é o modelo da relação amorosa entre homens e belos efebos. O primeiro verso do epigrama remete ao verso inicial dos Fenômenos de Arato  (Ἐκ Διὸς ἀρχώμεσθα, τὸν οὐδέποτ' ἄνδρες ἐῶμεν...). O epigrama também relembra a Teogonia de Hesíodo, uma vez que o poema abre com uma  invocação às Musas do Hélicon, em versos muito parecidos com os de Estratão: Μουσάων Ἑλικωνιάδων ἀρχώμεθ' ἀείδειν, "Pelas Musas Heliconíades comecemos a cantar". 


"Por Zeus comecemos" - como dissera Arato;
com vocês, Musas, hoje eu não me importo.
Pois se eu adoro meninos e com eles reúno-me,
O que tem a ver com isso as Musas Heliconíades?

Ἐκ Διὸς ἀρχώμεσθα, καθὼς εἴρηκεν Ἄρατος·
 ὑμῖν δ', ὦ Μοῦσαι, σήμερον οὐκ ἐνοχλῶ.
εἰ γὰρ ἐγὼ παῖδάς τε φιλῶ καὶ παισὶν ὁμιλῶ,
 τοῦτο τί πρὸς Μούσας τὰς Ἑλικωνιάδας;

II

Não procures em meus escritos Príamo nos altares,
nem as dores de Medeia e Níobe;
nem Ítis no leito ou rouxinóis nas pétalas;
isso os antigos escreveram em profusão.
Mas o doce Amor,  misturado às propícias Graças,
e Brômio: p'ra isso, rosto sério não convém.

Μὴ ζήτει δέλτοισιν ἐμαῖς Πρίαμον παρὰ βωμοῖς,
 μηδὲ τὰ Μηδείης πένθεα καὶ Νιόβης,
μηδ' Ἴτυν ἐν θαλάμοις καὶ ἀηδόνας ἐν πετάλοισιν·
 ταῦτα γὰρ οἱ πρότεροι πάντα χύδην ἔγραφον·
ἀλλ' ἱλαραῖς Χαρίτεσσι μεμιγμένον ἡδὺν Ἔρωτα
 καὶ Βρόμιον· τούτοις δ' ὀφρύες οὐκ ἔπρεπον.

IV
Assim como cita um verso de Arato em I, nos versos 5-6 deste epigrama Estratão relembra o verso 20 do fr.1 dos Aetia de Calímaco (βροντᾶ⌋ν οὐκ ἐμόν, ⌊ἀλλὰ⌋ Διός, "trovo]ar não é comigo, e sim com Zeus"), referindo-se aqui, evidentemente, não à paixão de Zeus pelos trovões, mas por meninos. No verso 8 lemos  “τὸν δ' ἀπαμειβόμενος”, "disse-lhe em resposta", expressão formular em Homero, usada para introduzir a resposta  de um herói a outro (ou, por vezes, a divergência...)

Deleito-me no viço de um rapaz de doze;
 o de treze, é mais desejável que esse;
o de catorze, mais doce que a flor dos Amores;
mais deleitável o que está chegando aos quinze;
Dezesseis, que idade divina! Mas procurar
os de dezessete não é comigo, e sim com Zeus.
E se alguém deseja um mais velho, não está mais brincando,
mas já procura por um "Disse-lhe em resposta";

Ἀκμῇ δωδεκέτους ἐπιτέρπομαι· ἔστι δὲ τούτου
χὠ τρισκαιδεκέτης πουλὺ ποθεινότερος·
χὠ τὰ δὶς ἑπτὰ νέμων γλυκερώτερον ἄνθος Ἐρώτων,
τερπνότερος δ' ὁ τρίτης πεντάδος ἀρχόμενος·
ἑξεπικαιδέκατον δὲ θεῶν ἔτος· ἑβδόματον δὲ
καὶ δέκατον ζητεῖν οὐκ ἐμόν, ἀλλὰ Διός.
εἰ δ' ἔτι πρεσβυτέρου τις ἔχει πόθον, οὐκέτι παίζει,
ἀλλ' ἤδη ζητεῖ “τὸν δ' ἀπαμειβόμενος”.

V

Adoro os pálidos, mas amo os morenos,
e os loiros também; gosto, aliás, dos de cabelos negros;
e não dispenso os de olhos castanhos, mas sobretudo
por cintilantes olhos negros eu me apaixono.

Τοὺς λευκοὺς ἀγαπῶ, φιλέω δ' ἅμα τοὺς μελιχρώδεις
καὶ ξανθούς, στέργω δ' ἔμπαλι τοὺς μέλανας·
οὐδὲ κόρας ξανθὰς παραπέμπομαι· ἀλλὰ περισσῶς
τοὺς μελανοφθάλμους αἰγλοφανεῖς τε φιλῶ.


VI

A venalidade das relações sexuais. 

"Ânus" e "Ouro" têm o mesmo número de sílabas poéticas.
Fiz a conta outro dia e descobri sem querer.

Πρωκτὸς καὶ χρυσὸς τὴν αὐτὴν ψῆφον ἔχουσιν·
ψηφίζων δ' ἀφελῶς τοῦτό ποθ' εὗρον ἐγώ.


[Tradução: Rafael Brunhara]

segunda-feira, novembro 18, 2013

Antologia Grega 7.6 [Antípatros de Sídon]

Ἡρώων κάρυκ' ἀρετᾶς, μακάρων δὲ προφήταν,
Ἑλλάνων βιοτᾷ δεύτερον ἀέλιον,
Μουσῶν φέγγος Ὅμηρον, ἀγήραντον στόμα κόσμου
παντός, ἁλιρροθία, ξεῖνε, κέκευθε κόνις.

Ao arauto da virtude de heróis, vate dos venturosos,
segundo sol da vida grega
esplendor das Musas, Homero, voz sem velhice no mundo
inteiro; cobre-o, estrangeiro, a areia batida pelo mar.

[Tradução de Rafael Brunhara]


sábado, novembro 16, 2013

[Hinos Órficos] Hino aos Curetes

Ὕμνος Κουρήτων.


Σκιρτηταὶ Κουρῆτες, ἐνόπλια βήματα θέντες,
ποσσίκροτοι, ῥομβηταί, ὀρέστεροι, εὐαστῆρες,
κρουσιλύραι, παράρυθμοι, ἐπεμβάται, ἴχνεσι κοῦφοι,
ὁπλοφόροι, φύλακες, κοσμήτορες, ἀγλαόφημοι,
μητρὸς ὀρειομανοῦς συνοπάονες, ὀργιοφάνται· (5)
ἔλθοιτ' εὐμενέοντες ἐπ' εὐφήμοισι λόγοισι,
βουκόλωι εὐάντητοι ἀεὶ κεχαρηότι θυμῶι.

Hino dos Curetes

Lépidos Curetes em passos marciais,
pulsando o chão com os pés, rugentes nos montes bradando evoés;
liristas dissonantes, cavaleiros de rastros sutis;
armígeros guardiões, generais de esplêndida fama,
orgifantes, companheiros da mãe que delira nas montanhas; (5)
Peço, vinde benfazejos por minhas auspiciosas palavras,
sempre afáveis ao boiadeiro, com um grato coração.

[Tradução: Rafael Brunhara]

sexta-feira, novembro 08, 2013

Hino Órfico 30: Dioniso

[Διονύσου], θυμίαμα στύρακα.


Κικλήσκω Διόνυσον ἐρίβρομον, εὐαστῆρα,
πρωτόγονον, διφυῆ, τρίγονον, Βακχεῖον ἄνακτα,
ἄγριον, ἄρρητον, κρύφιον, δικέρωτα, δίμορφον,
κισσόβρυον, ταυρωπόν, Ἀρήιον, εὔιον, ἁγνόν,
ὠμάδιον, τριετῆ, βοτρυηφόρον, ἐρνεσίπεπλον. (5)
Εὐβουλεῦ, πολύβουλε, Διὸς καὶ Περσεφονείης
ἀρρήτοις λέκτροισι τεκνωθείς, ἄμβροτε δαῖμον·
κλῦθι, μάκαρ, φωνῆς, ἡδὺς δ' ἐπίπνευσον ἀμεμ[φ]ής
εὐμενὲς ἦτορ ἔχων, σὺν ἐυζώνοισι τιθήναις.

[De Dioniso], Fumigação: Estoraque

Invoco Dioniso de amplo clamor, que brada evoés,
primogênito de duas naturezas e três vezes nascido, Baco soberano;
feroz e inefável, oculto, bicórneo, biforme,
hederoso de táureo olhar, guerreiro, puro deus,
crudívoro, trienal, vinífero de véu vernal; (5)
Eubuleu de muitos conselhos, por Zeus e Perséfone
em nefando leito engendrado, nume imortal!
Ouve,venturoso, minha voz, e sopra suave até nós, impecável,
com peito benfazejo, junto de tuas nutrizes de bela cintura.

[Tradução: Rafael Brunhara]

[Hinos Órficos] Hino a Perséfone

<Ὕμνος Περσεφόνης.>

Φερσεφόνη, θύγατερ μεγάλου Διός, ἐλθέ, μάκαιρα,
μουνογένεια θεά, κεχαρισμένα δ' ἱερὰ δέξαι,
Πλούτωνος πολύτιμε δάμαρ, κεδνή, βιοδῶτι,
ἣ κατέχεις Ἀίδαο πύλας ὑπὸ κεύθεα γαίης,
Πραξιδίκη, ἐρατοπλόκαμε, Δηοῦς θάλος ἁγνόν, (5)
Εὐμενίδων γενέτειρα, ὑποχθονίων βασίλεια,
ἣν Ζεὺς ἀρρήτοισι γοναῖς τεκνώσατο κούρην,
μῆτερ ἐριβρεμέτου πολυμόρφου Εὐβουλῆος,
Ὡρῶν συμπαίκτειρα, φαεσφόρε, ἀγλαόμορφε, (10)
σεμνή, παντοκράτειρα, κόρη καρποῖσι βρύουσα,
εὐφεγγής,κερόεσσα, μόνη θνητοῖσι ποθεινή,
εἰαρινή, λειμωνιάσιν χαίρουσα πνοῆισιν,
ἱερὸν ἐκφαίνουσα δέμας βλαστοῖς χλοοκάρποις,
ἁρπαγιμαῖα λέχη μετοπωρινὰ νυμφευθεῖσα, (15)
ζωὴ καὶ θάνατος μούνη θνητοῖς πολυμόχθοις,
Φερσεφόνη· φέρβεις γὰρ ἀεὶ καὶ πάντα φονεύεις.
κλῦθι, μάκαιρα θεά, καρποὺς δ' ἀνάπεμπ' ἀπὸ γαίης
εἰρήνηι θάλλουσα καὶ ἠπιοχείρωι ὑγείαι
καὶ βίωι εὐόλβωι λιπαρὸν γῆρας κατάγοντι (20)
πρὸς σὸν χῶρον, ἄνασσα, καὶ εὐδύνατον Πλούτωνα.

Perséfone, filha do grande Zeus, vem, venturosa
Deusa unigênita, e aceita, grata, os sacrifícios!
Esposa muito honrada de Plutão,diligente doadora da vida
que reges os portais do Hades nos recônditos da terra;
Justiceira [Praxídice] de adoráveis tranças, puro rebento de Démeter,
genetriz das Eumênides; rainha subterrânea,
donzela que Zeus engendrou em nefanda união;
mãe do altitroante multiforme Eubuleu,
lucífera de esplêndida forma que brinca com as Horas,
onipotente insigne, donzela florescente de frutos,
cornígera brilhante deusa, só tu és desejada pelos mortais;
na primavera te agradas com as brisas dos prados,
e revelas sua sagrada forma no desabrochar dos verdes frutos;
no outono, te tornaste noiva, levada à força ao leito;
És a vida e a morte para os mortais sofredores,
Perséfone! Sempre alimentas[pherseis] a todos, e a todos aniquilas; [phoneis];
Ouve-me, venturosa deusa, envia-nos os frutos da terra
viçando em paz e saúde generosa,
e trazendo a uma vida afortunada o conforto da velhice
em teu reino, soberana, e de Plutão poderoso.

[Tradução: Rafael Brunhara]



Antologia Grega 5.255 - Paulo Silenciário

Eu vi amantes no irresistível furor
fixarem lábios longamente um no outro,
mas sem saciar o amor severo, anelando,
se fás,poder entrar na alma um do outro:
aplacavam só um pouco o desejo incurável (5)
mútuo envoltos em tenros cobertores.
ele, completo símile de Aquiles quando
na alcova das filhas de Licomedes [1];
ela, moça com cinto à coxa alvinitente
atado, moldada à forma de Febe [2] : (10)
premem de novo os lábios, era infatigável
a fome voraz por insano amor;
Mais fácil romper duas vinhas emaranhadas,
torcidas, por anos crescendo juntas
do que eles, aos beijos, com opostos braços (15)
enlaçando forte os lânguidos membros;
Tão feliz, querida, quem é preso em tais peias;
Tão feliz! Nós, apartados, ardemos.

Εἶδον ἐγὼ ποθέοντας· ὑπ' ἀτλήτοιο δὲ λύσσης
δηρὸν ἐν ἀλλήλοις χείλεα πηξάμενοι,
οὐ κόρον εἶχον ἔρωτος ἀφειδέος· ἱέμενοι δέ,
εἰ θέμις, ἀλλήλων δύμεναι ἐς κραδίην,
ἀμφασίης ὅσον ὅσσον ὑπεπρήυνον ἀνάγκην (5)
ἀλλήλων μαλακοῖς φάρεσιν ἑσσάμενοι.
καί ῥ' ὁ μὲν ἦν Ἀχιλῆι πανείκελος, οἷος ἐκεῖνος
τῶν Λυκομηδείων ἔνδον ἔην θαλάμων·
κούρη δ' ἀργυφέης ἐπιγουνίδος ἄχρι χιτῶνα
ζωσαμένη Φοίβης εἶδος ἀπεπλάσατο. (10)
καὶ πάλιν ἠρήρειστο τὰ χείλεα· γυιοβόρον γὰρ
εἶχον ἀλωφήτου λιμὸν ἐρωμανίης.
ῥεῖά τις ἡμερίδος στελέχη δύο σύμπλοκα λύσει,
στρεπτά, πολυχρονίῳ πλέγματι συμφυέα,
ἢ κείνους φιλέοντας, ὑπ' ἀντιπόροισί τ' ἀγοστοῖς (15)
ὑγρὰ περιπλέγδην ἅψεα δησαμένους.
τρὶς μάκαρ, ὃς τοίοισι, φίλη, δεσμοῖσιν ἑλίχθη,
τρὶς μάκαρ· ἀλλ' ἡμεῖς ἄνδιχα καιόμεθα.


[Tradução: Rafael Brunhara]


[1] Licomedes: rei de Ciros. Quando a Deusa Tétis previu que Aquiles morreria em Troia, convenceu o rei a acolher o filho em sua corte, disfarçado como uma menina. Enquanto esteve lá em disfarce, Aquiles manteve relações com Deidâmia, filha de Licomedes, que então daria luz a Neoptólemo.
[2] Febe é Ártemis; No período em que o poema foi composto, a divindade também passa a ser associada à lua. Comparar jovens meninas, tanto a Ártemis quanto à Lua, era expediente comum na literatura grega. Aqui, refere-se sobretudo à alvura brilhante (ἀργυφέης, argyphées, daí, "alvinitente") da pele da amada. Ver também Od.6.150-152, passagem na qual Odisseu compara Nausícaa a Ártemis, pela "altura, beleza e porte".

* Poema de Paulo Silenciário (575 d.C ou 585 d.C.), poeta grego que atuou em Constantinopla, e compôs, entre outros epigramas, uma écfrase da igreja de Hagia Sofia. Dele restaram-nos aproximadamente oitenta poemas eróticos, publicados no Ciclo de Agatias e conservados pela Antologia Palatina.
Neste poema, o poeta inveja dois amantes apaixonados, aos beijos e com os corpos enlaçados (vv.1-16). Ressalta, contudo, que essa união é imperfeita: tal é o desejo de amor desses amantes que o melhor seria se pudessem não só misturar os seus corpos, mas também as próprias almas (vv. 3-6). Porém o último dístico (vv.17-18) traz uma reviravolta: apesar da união dos amantes não ser perfeita, é melhor situação que a dele, que se encontra distante de sua amada. Notável é a introdução de uma comparação mitológica (Aquiles na corte de Licomedes), que de certa maneira se assemelha aos procedimentos empregados na elegia erótica latina.