terça-feira, novembro 28, 2023

Esses poetas - Alcides Villaça

Esse tem um plano, e já se aplaude.

Esse arde em memória, lembra e sopra.

Esse quer ter saudade, abre e morde.

Esse tem mistério, solta e fecha.

Esse faz humor, diz que desdiz.

Esse tem traçados, pesos, balanças.

Esse faz versinhos, chuleia em casa.

Esse faz história, borda pra fora.

Esse é rapsodo, come de tudo.

Esse é noctívago, retoca olheiras.

Esse é sonâmbulo, vive em sacadas.

Esse é pintor, usa dedos de água.

Esse é diabético, requer penínsulas.

Esse é ingênuo, dá o braço a virgílio.

Esse é irônico, quase não confessa.

Esse é dramático, cospe a própria máscara.

Esse é profundo, nunca vem à tona.

Esse é tão casto, toca luvas na harpa.

Esse é sem norte, sem sul, sem sorte.

Esse é tão seco, ninguém tem saco.

Esse é tão sutil, dedilha anagramas.

Esse é tão ambíguo, versos tão bimembres.

Esse é tão puro, tão puro, tão puro. 


Alcides Villaça in: Ondas Curtas. São Paulo: Cosac&Naify, 2014. 

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