Meu pai perdi no tempo e ganho em sonho
Se a noite me atribui poder de fuga,
sinto logo meu pai e nele ponho
o olhar, lendo-lhe a face, ruga a ruga.
Está morto, que importa? Inda madrugada
e seu rosto,nem triste nem risonho,
é o rosto, antigo, o mesmo. E não enxuga
suor algum, na calma de meu sonho.
Ó meu pai arquiteto e fazendeiro!
Faz casas de silêncio, e suas roças
de cinza estão maduras, orvalhadas
por um rio que corre o tempo inteiro,
e corre além do tempo, enquanto as nossas
murcham num sopro fontes represadas.
Carlos Drummond de Andrade,
Claro Enigma., 1951
Um comentário:
Que seja abençoado o encontro do Rio com seus sonhos. E que eles sejam jamais naufragados!
Abraços
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