sexta-feira, junho 28, 2019

Sófocles: Ode ao homem (vv.332-375) - Trad. Barão de Paranapiacaba (1909)


Entre os muitos prodígios do mundo,

O homem forma o prodígio maior;

Ele doma o oceano profundo,

Que, espumante, lhe muge em redor,

Ao sopro dos nimbosos

Nótos impetuosos.



Volve, do arado ao gume,

Em annual semeio

Da Terra, antigo Nume,

O inexhaurível seio.

Tem, para auxilial-o,

A força do cavallo.



Para as aves, que giram na esphera,

Dispõe visco, gaiola e boiz;

Arma laços nos bosques á féra

E nas agoas aos peixes subtis.

Com rêde, facho e engodo

Cardumes colhe, a rôdo.



Da opaca selva tira

Cavallo de amplas crinas

E o touro, que respira

Ar flammeo das narinas;

A'quelle um freio ageita,

Ao jugo este sujeita.



Fala; e tem altas cousas expresso;

Dá leis sábias e povos dirige;

Contra os riscos ha feito recesso

Nas seguras moradas, que erige.



Dalli um desafio

Arroja ao vento, ao frio.

E firme na insistencia

De tudo prevenir

Estende a providencia

Aos males ]do porvir.

E, sem que a morte vença,

Dá golpes na doença



Engenhoso da industria no invento,

Habil, destro, qual não se imagina,

Ora, ao bem elle applica o talento,

Ora, a força do mal o domina;

E abusa do poder

Para as leis corromper.



Si é chefe e as leis arrostra,

De crimes polluido

Seja eloquente amostra

De um rei destituido.

Mas nunca o mesmo abrigo

Comparta elle comsigo.*

[*Nota do Tradutor. Literalmente: "Grande ao Estado, ajuntando a esta industria as leis de sua patria e o direito sagrado dos Deoses, mas indigno do nome de cidadão é aquelle a quem o que não é bello se prende por causa de sua audacia. Jamais o que pratica estas cousas, se assentará ao mesmo lar, nem pensará como eu.


FONTE:
SOPHOCLES. Antigone, tragédia em 4 actos. Versão poética portugueza de Barão de Parapiacaba.Rio de Janeiro: Oficinas da Renascença. 1909.

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