sexta-feira, novembro 20, 2009

Álcman, Fragmento 59 a

Eros, de novo, de Chipre adrede
doce derrama-se e acalenta meu peito

[Tradução: Rafael Brunhara]

Álcman 89 PMG

Dormem cimos de montanhas e precipícios,
promontórios e leitos de rios;
A grei das serpentes que a terra negra nutre
e as feras montesas; tanto a raça das abelhas
quanto os monstros nos abismos do salso mar purpúreo;
dorme a grei dos pássaros de lépidas asas

Anoitecer

É a hora em que o sino toca,
mas aqui não há sinos;
há somente buzinas,
sirenes roucas, apitos
aflitos, pungentes, trágicos,
uivando escuro segredo;
desta hora tenho medo.

É a hora em que o pássaro volta,
mas de há muito não há pássaros;
só multidões compactas
escorrendo exaustas
como espesso óleo
que impregna o lajedo;
desta hora tenho medo.

É hora do descanso,
mas o descanso vem tarde,
o corpo não pede sono,
depois de tanto rodar;
pede paz - morte - mergulho
no poço mais ermo e quedo;
desta hora tenho medo.

Hora de delicadeza,
gasalho, sombra, silêncio.
Haverá disso no mundo?
É antes a hora dos corvos,
bicando em mim, meu passado,
meu futuro, meu degredo;
desta hora tenho medo.

domingo, novembro 15, 2009

Safo: Fragmentos 49, 55, 102 e 130

49
Eu te amava, Átis, outrora...
...parecias-me pequenina e sem encantos.

55
Morta, jazerás: e não mais memória de ti
haverá então, nem saudade; pois não tiveste parte nas rosas
da Piéria. Invisa no palácio de Hades
vaguearás, entre débeis cadáveres esvoaçante.

102
Doce mãe, já não posso mais tecer a trama
por desejo a um rapaz domada pela esguia Afrodite.

130
Eros, de novo, que os membros deslassa, perturba-me:
doce e amargo, invencível monstro.

(Tradução: Rafael Brunhara)

Olavo Bilac: Lendo a Ilíada

Ei-lo, o poema de assombros, céu cortado
De relâmpagos, onde a alma potente
De Homero vive, e vive eternizado
O espantoso poder da argiva gente.

Arde Tróia... De rastos passa atado
O herói ao carro do rival, e, ardente,
Bate o sol sobre um mar ilimitado
De capacetes e de sangue quente.

Mais que as armas, porém, mais que a batalha
Mais que os incêndios, brilha o amor que ateia
O ódio e entre os povos a discórdia espalha:

- Esse amor que ora ativa, ora asserena
A guerra, e o heróico Páris encadeia
Aos curvos seios da formosa Helena.

sábado, novembro 14, 2009

Os Lusíadas, IX, 75-83

Leonardo, soldado bem disposto,
Manhoso, cavaleiro e namorado,
A quem Amor não dera um só desgosto,
Mas sempre fora dele mal tratado,
E tinha já por firme pressuposto
Ser com amores mal afortunado,
Porém não que perdesse a esperança
De inda poder seu fado ter mudança,

Quis aqui sua ventura que corria
Após Efire, exemplo de beleza,
Que mais caro que as outras dar queria
O que deu, para dar-se, a Natureza
Já cansado, correndo, lhe dizia:
- "Ó fermosura indigna de aspereza,
Pois desta vida te concedo a palma,
Espera um corpo de quem levas a alma!

-"Todas de correr cansam, Ninfa pura,
Rendendo-se à vontade do inimigo;
Tu só de mim só foges na espessura?
Quem te disse que eu era o que te sigo?
Se to tem dito já aquela ventura
Que em toda parte sempre anda comigo,
Oh, não na creias, porque eu, quando a cria,
Mil vezes cada hora me mentia!

"Não canses, que me cansas! E se queres
Fugir-me, por que não possa tocar-te,
Minha ventura é tal que, inda que esperes,
Ela fará que não possa alcançar-te!
Espera! quero ver, se tu quiseres,
Que sutil modo busca de escapar-te,
E notarás, no fim deste sucesso,
Tra la spica e la man qual muro he messo.

Oh, não me fujas! Assim nunca o breve
Tempo fuja de tua fermosura!
Que, só com refrear o passo leve,
Vencerás da Fortuna a força dura.
Que Imperador, que exército se atreve
A quebrantar a fúria da ventura
Que, em quanto desejei, me vai seguindo,
O que tu só farás não me fugindo?

"Pões-te da parte da desdita minha?
Fraqueza é dar ajuda ao mais potente.
Levas-me um coração que livre tinha?
Solta-mo, e correrás mais levemente.
Não te carrega essa alma tão mesqunha
Que, nesses fios de ouro reluzente,
Atada levas? Ou, depois de presa,
Lhe mudaste a ventura, e menos pesa?

"Nesta esperança só te vou seguindo:
Que ou tu não sofrerás o peso dela,
Ou na virtude de teu gesto lindo
Lhe mudarás a triste e dura estrela!
E se se lhe mudar, não vás fugindo,
Que Amor te ferirá, gentil donzela,
E tu me esperarás, se Amor te fere;
E se me esperas, não há mais que se espere!"

Já não fugia a bela Ninfa tanto,
Por se dar cara ao triste que a seguia,
Como por ir ouvindo o doce canto,
As namoradas mágoas que dizia.
Volvendo o rosto, já sereno e santo,
Toda banhada em riso de alegria,
Cair se deixa aos pés do vencedor,
Que todo se desfaz em puro amor.

Oh que famintos beijos na floresta!
E que mimoso choro que soava!
Que afagos tão suaves! Que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
O que mais passam na manhã e na sesta,
Que Vênus com prazeres inflamava,
Melhor é exprimentá-lo que julgá-lo,
Mas julgue-o quem não pode exprimentá-lo.

segunda-feira, novembro 02, 2009

Anacreonte (fr.eleg.2)

Não gosto de quem, bebendo vinho junto ao crater repleto,
fala de querelas e da guerra lácrima

e sim de quem, resplandecentes dons das Musas e Afrodite
mesclando, comemora a desejável alegria.

(Tradução de Rafael Brunhara)

Skholia 893 PMG

No ramo de mirto vou levar a espada,
tal qual Harmódio e Aristogíton
quando iam ambos assassinar o tirano
e tornar Atenas igual em direitos.

Skholia 900 PMG

Ah, se eu fosse uma bela lira de marfim
e belos meninos me levassem ao coro de Dioniso!

[Tradução: Rafael Brunhara]

Anacreonte 348 PMG

Suplico-te, golpeadora de cervos,
loura filha de Zeus, de agrestes
bestas a senhora, Ártemis,
que algures sobre os remoinhos
do Leiteio perscruta a cidade
de varões de fero coração,
grata - pois de cidadãos
indômitos não és pastora.

(Tradução de Rafael Brunhara)

Safo 34 V

Astros ao redor da bela lua
De pronto ocultam sua luz fanal
quando plena ela mais fulge
argêntea
sobre a terra.

(Tradução: Rafael Brunhara)

Calímaco - Epigrama 2 P

Alguém falou, Heráclito, de tua morte, e me levou
às lágrimas. Lembrei-me de quantas vezes nós dois,
em colóquio,fizemos o sol se pôr. Tu, hóspede
do Halicarnasso, és - presumo - cinza há muitas eras:
mas vivem teus rouxinóis; sobre eles, Hades
raptor de tudo a mão não lança.

(Tradução de Rafael Brunhara)