terça-feira, fevereiro 17, 2009

Antologia Grega: Paladas de Alexandria

1.
Só isso, a vida: um instante de prazer. Para longe, mágoas.
Se é tão breve a existência dos homens, que venha Baco
com as suas danças, coroas de flores, mulheres.
Hoje eu quero ser feliz - ninguém sabe nada do amanhã. (5.72)

2.

Fortuna que retalhaste sempre a vida,
desnaturando-lhe o vinho sem mistura,
agora que taverneira, não mais deusa,
te dedicas a misturar e a servir,
tens ofício mais conforme ao teu caráter. (9,180)

3.
Ouro, pai dos aduladores,filho da aflição e do cuidado,
não te possuir dá medo e possuir-te aflição. (9.394).

4.
Admirou-me ver, nas encruzilhadas, o brônzeo filho
de Zeus, tão invocado outrora, ora por terra,
e irado exclamei: "Oh trilunar que nos guarda dos males
e nunca foste derrotado, hoje tombaste".
Mas de noite, ao pé do leito, Héracles disse-me a sorrir:
"Embora deus, aprendi a sujeitar-me aos tempos". (9.441)

5.
A filha do gramático ajuntou-se e teve uma criança
do gênero masculino, feminino e neutro. (9.489)

6.
Muita coisa pode acontecer entre o cálice e o lábio. (10.32).

7.

Se lembrares, homem, como foste por teu pai gerado,
esquecerás as idéias de grandeza.
Platão, o sonnhador, encheu tua cabeça de empáfia
ao te chamar de imortal, planta celeste.
De barro és feito; por que a presunção? Só fala assim
quem se compraz em fingimentos vistosos.
Mas se buscas a verdade, recorda que vieste de um
ato de luxúria e de uma gota suja. (10.45)

8.
A inveja, segundo Píndaro, é melhor que a compaixão;
os invejados levam uma vida esplêndida,
enquanto aos desgraçados lamentamos. Mas eu não queria
ser rico por demais nem motivo de pena.
O meio termo é ideal, pois a opulência extremada
traz perigos e a extremada penúria insultos. (10.51)

9.
Vim nu à terra e nu irei para debaixo dela.
Por que canseiras vãs se o fim é só nudez? (10.58)

10.

A espera da morte é causa de aflição dolorosa;
dela se poupa o mortal quando perece.
Por conseguinte, não lamentes quem desta vida se foi:
além da morte não existe mais dor. (10.59)

11.

Enriqueces; e daí? Quando morreres, a riqueza por acaso
te seguirá ao te arrastarem para o túmulo?
No juntá-la gastaste o teu tempo de vida; não poderias
pagar por ela preço mais exorbitante. (10.60)

12.
Navegação perigosa, a vida: em meio às tempestades,
somos às vezes mais de lastimar que náufragos.
Tendo como piloto de nossas vidas a Fortuna,
incertamente é que vogamos no mar alto;
uns fazem boa viagem, outros ao contrário, mas
todos chegam ao mesmo porto sob a terra (10.65).

13.
Um palco, a vida, e uma comédia; ou aprendes a dançar, deixando
a sisudez de lado, ou lhe aguentarás as dores. (10.72)

14.

Acaso estamos mortos e só aparentamos
estar vivos, nós gregos caídos em desgraça,
que imaginamos a vida semelhante a um sonho,
ou estamos vivos e foi a vida que morreu? (10.82).

15.

Creio que o deus é também um filósofo.
As blasfêmias não o irritam desde logo,
mas com o passar do tempo, ele aumenta os castigos
dos mortais miseráveis e perversos. (10.94)

16.
Todos os mortais têm de pagar a dívida da morte
pois ninguém sabe se amanhã estará vivo.
Aprende bem esta lição e cuida de alegrar-te, oh homem,
que tens no vinho o esquecimento do teu fim.
Deleita-te com Afrodite nessa tua vida efêmera
e deixa a Fortuna cuidar de todo o resto. (11.62)

17.
Quem por desgraça se casou com mulher feia
vê o escuro da noite quando acende as lâmpadas.(11.287)

18.
Toda mulher desperta cólera, salvo em dois bons momentos:
um quando na cama, o outro quando na campa. (11.381).

19.

Melhor louvar, a repreensão sempre traz inimizade.
Falar mal todavia é puro mel ático.(11.341)

20.
A cólera de Aquiles foi motivo, para mim também,
de funesta pobreza ao me tornar gramático.
Prouvera com os gregos me matasse aquela cólera antes
que me arruinasse a amarga fome da gramática.
No entanto, para que Agamemnon raptasse Briseida e Páris
roubasse Helena, foi que me fiz indigente.(9.169)


Tradução: José Paulo Paes.
Fonte: Paladas de Alexandria, epigramas. São Paulo: Alexandria, 1992.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

O reconhecimento de Penélope - Odisséia, XXIII. 173- 240

Disse-lhe,então, em resposta, Penélope muito sensata:
"Homem estranho! Não sinto desprezo, nem sou orgulhosa,
nem em excesso te admiro, pois bem sei que traços tu tinhas
antes de te ires desta ilha em navios de remos compridos.
Mas enfim, seja! Euricléia, prepara-lhe o sólido leito
fora do quarto de bela feitura construído por ele.
A cama, pois, lhe prepara do lado de fora e recobre
com boas peles e mantos e colchoas de linha esplendente."
Isso disse ela, com o fim de provar o marido. Odisseu
muito indignado se vira e responde à consorte prudente:
"Essas palavras, mulher, me excruciam, realmente, o imo peito.
Quem pôde o leito tirar do lugar? Mui difícil se-lo-ia
para qualquer dos mortais, embora hábil. Só mesmo um dos deuses
conseguiria, sem grande trabalho, mudá-lo de sítio.
Mas nenhum homem que vive da terra, conquanto mui forte,
o poderia abalar facilmente; um sinal tinha outrora,
particular, esse leito bem-feito, que eu próprio construíra.
Uma oliveira de espessa folhagem no pátio crescera;
como coluna era o tronco maciço depois de florido.
À volta dele elevei minha câmara, até vê-la pronta,
toda de filas de pedras e um teto bem-feito por cima.
Sólidas portas lhe pus, trabalhadas com muito carinho.
Só depois disso cortei a folhagem da grande oliveira,
e o tronco todo lavrei, desde baixo, alisando-o com bronze,
muito hablilmente, tomando as medidas de tudo com fio,
para em um pé transformá-lo, da cama, furando-o com trado.
Desse começo construí toda a cama, até vê-la concluída,
pondo-lhe vários enfeites de prata, marfim e ouro puro,
e distendendo umas tiras de couro, de brilho purpúreo.
Eis o sinal que me apraz revelar-te. No entanto, ora ignoro
se ainda está firme o meu leito no mesmo lugar, ou se acaso
tendo cortado bem cerce a oliveira, dali o removeram."
Isso disse ele; abalou-se-lhe o peito, fraquearam-lhe os joelhos,
reconhecendo o sinal que Odisseu, tão preciso, dissera.
Logo para ele, direita, correu, lacrimosa, e passando-lhe
os braços pelo pescoço, beijou-lhe a cabeça e lhe disse:
"Não te enraiveças comigo, Odisseu, visto seres dos homens
o mais sensato. Infortúnios bastantes os deuses nos deram,
não consentindo que, juntos, viver aqui sempre pudéssemos
e a juventude gozar, té não ser a velhice chegada.
Não fiques, pois, agastado, nem faças nenhuma censura
por não te haver, no primeiro momento, corrido a abraçar-te.
O coração no imo peito se achava em constante receio
de que pudesse alguém vir enganar-me com ditos falazes,
pois muitos homens, realmente, meditam maldosos desígnios.
A própria Helena da Argólida, filha de Zeus poderoso,
jamais ao leito de um homem de fora teria subido
se, porventura, pudesse saber que os Aqueus belicosos
para o palácio de novo a trariam, à terra nativa.
Um deus, sem dúvida, a fez praticar tal ação vergonhosa,
sem que tivesse, realmente, no espírito a culpa funesta
premeditado, que a origem nos foi de tão grande infortúnio.
Ora, porém, que mostrasse saber o sinal evidente
do nosso leito, que nunca mortal jamais teve ante aos olhos,
a não ser nós e uma serva somente, entre todas as fâmulas,
a filha de Áctor, que, ao vir para aqui, por meu pai foi dada,
e nos guardou sempre as portas do tálamo forte e bem-feito,
o coração convenceste-me, embora receoso estivesse."
Essas palavras no herói despertaram o pranto incontido;
e a soluçar apertava nos braços a esposa querida.
Tal como a vista da terra distante é agradável aos náufragos,
quando, em mar alto, o navio de boa feitura Posido
faz soçobrar, sob o impulso dos ventos e de ondas furiosas;
poucos conseguem chegar até o firme, nadando nas ondas
de cor escura, com os membros cobertos de espessa salsugem,
e ledos pisam a praia, enfim tendo da Morte escapado;
do mesmo modo a Penélope a vista do esposo era cara,
sem que pudesse dos cândidos braços, enfim,desprendê-lo.

Tradução de Carlos Alberto Nunes

domingo, fevereiro 08, 2009

Arquíloco, 122 W

Não se extranhe ou negue cousa alguma,
depois que Zeus Olímpio fez do dia
noite, ocultando a luz do sol brilhante,
e aos homens abateu gelado medo.
Em tudo creiam todos, tudo esperem,
nem se espante ninguém, se acaso as feras
com os delfins as moradas permutarem,
do mar sonoro as ondas preferindo
e estes houverem por mais grato o monte.

Tradução de Aluízio Faria de Coimbra.

Fonte
:Os elegíacos gregos I: de Calino a Crates. São Paulo: 1941.

Mensagem

II. OS CASTELLOS

PRIMEIRO/ULYSSES

O Mytho é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mytho brilhante e mudo -
O corpo morto de Deus,
Vivo e desnudo.

Este, que aqui aportou
Foi por não ser existindo.
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo
E nos creou.

Assim a lenda se escorre
A entrar na realidade
E a fecundal-a decorre.
Em baixo, a vida, metade
De nada, morre.