Hinos, que a lira comandais! Que herói, que nume
Ou que varão celebraremos hoje? É Zeus,
Que reina em Pisa, e Hércules, que fez de Olímpia
o berço das competições, e também Térão,
Térão, primeiro na quadriga, de Agrigento,
Bravo, sensato campeão que honrou as almas
Daqueles ancestrais que após esforço ingente
Junto do rio uma cidade santa ergueram, foram
Sêmen da Sicília, e os protegeu destino
Aventurado,e em prol da raça e da virtude
Que tiveram, honra e ouro receberam!
Ó Crônio filho de Réia, alma dos torneios
De Olímpia e rio Alfeu, atento a esses cantares,
A cara pátria tu preserves aos que são
Seus descendentes, e do que já passou,
O fim das coisas, mal ou bem, não pode o Tempo
(É pai de tudo)invalidar, no esquecimento.
Contudo, a boa sina vai nascer pra nós,
E o nobre canto mata a dor que quer se alçar,
Quando a Moira do deus manda o bem, qual se deu
Com Cadmo e suas filhas tão sofridas,
Para quem todo mal veio a acabar-se um dia.
Morreu Semele de cabelos longos sob o divo
Raio, e entre as divinais viveu depois,já bem
Tratada por Atena, Zeus e pelo deus
Da parra, Dioniso,diz-se também
Que entre as Ninfas do oceano Ino tem
Vida piedosa, abençoada! Mal conhecem
Os varões o fim de sua carreira,
E nem se vão viver num dia estrito
O sol de uma ventura inigualável:
Por essas ondas onde a vida gira
No bem ou na tristeza erramos sempre.
Olhai a raça de um tal Térão: com mirífico
Destino a Graça aquinhoou seus ancestrais.
Desde que Laio, entanto, foi morrer às mãos
De um filho seu, virou horror o que era belo,
Apolo o quis assim, e assim bem se cumpriu.
Depois, a lâmina do olhar de Erínia fez
Se engalfinharem os dois filhos do rei Édipo,
Um, Polinice, ao perecer, deixou
O filho seu Tersandro, ilustre em juvenis
Competições, rebento derradeiro que susteve
A casa dos Adrástidas, de onde veio
A plêiade de heróis que nesta hora eu canto.
Do sangue desses todos veio Enesidemo,
A quem ora tributo o preito da poesia
E os sons da lira, após vencer jogos de Olímpia,
Enquanto aos dois irmãos cederam todas Graças
Lindo laurel de Delfos e dos jogos do Istmo,
Pois doze voltas deu em glória a sua quadriga.
E o amor da glória sempre vence a todo medo.
Quando a riqueza se coroa coa virtude,
A tudo enfim se enfrenta pois inspira ardor
Impetuoso e vivo a febre de vencer,
Astro flamante e labareda para os vivos!
Ouro e virtude quem possui sabe o vindouro.
Sabe também que as almas dos culpados são
Punidas, ao findarem esta vida, se hão
A Zeus muito ofendido, e têm seu júri no Hades,
E o duro tribunal enfim se pronuncia.
Os bons enxergam claros sóis em plena noite,
Como se dia fosse, e, livres da labuta,
Não se escalavram mãos e braços no lavrar
Da terra, ou de salgado mar, em rude cata
Aos alimentos, mas - ao revés - o que respeita
Aos mandamentos sempre vive sem chorar,
Por eleição de Zeus, enquanto que os perjuros
A presa vêm a ser de insanas aflições.
E três encarnações, após terem vivido,
Ou seja noutro mundo ou neste, e hajam assim
a força de viverem longe da injustiça,
Então vão percorrer de Zeus a bela estrada
E de Saturno, e à ilha recebidos são
De todos Bem-Aventurados, que das auras
Do mar se toucam, onde raiam flores de ouro,
As terrestres nas árvores, e ao seio de ondas,
Outras, todas se entrelaçando qual grinaldas,
Onde o frontal e os braços não se apartam mais.
Tais são as justas regiões de Radamanto,
A quem a honra de um assento cedeu Crono,
Pai dos divinos, cônjuge de Réia, que há
Sua sede acima de imortais, lá onde moram
Peleu e Cadmo e Aquileu, e este por Tétis
Conduzido, cujas preces hão dobrado a Zeus.
Aquiles, que abateu Heitor, bastião de Tróia,
Que não apenas Cicno leva à tumba, mas
Também ao filho etíope da Aurora, Mêmnon.
Tenho na minha espalda a aljava com as setas
Que têm a voz para quem possa compreender,
Se bem que o vulgo exige sempre explicações.
Talento tem o homem que por natureza
Sabe o que sabe, pois quem sabe pelo estudo
É qual voral abutre em vão berrando contra
O divo pássaro de Zeus! Ora, minha'alma,
Pega o teu arco e vai ao ponto. E aonde a Musa
Minha suas setas vai jogar, que rendem glória?
A Agrigento, certamente, e eu o direi
Por jura consumada que nenhuma urbe
Desde há cem anos produziu um tal varão
Que tenha um coração tão terno e devotado,
E a mão mais generosa que Térão, embora
A glória sua seja um alvo dos covardes.
Tradução de Antonio Medina Rodrigues
Fonte:Revista Cultura Vozes, Volume 91- nº2, ano 91. Petrópolis: Vozes. Março/Abril de 1997
Um comentário:
Parabéns pela iniciativa deste blog! Está entre as melhores fontes de acesso ao mundo clássico.
Grande Abraço
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