sábado, setembro 06, 2008

Virgílio - 4º Bucólica

Ó Musas da Sicília, cantemos coisas mais elevadas.
Os arbustos e humildes tamarindos não agradam a todos.
Se cantamos florestas, que sejam as florestas dignas do cônsul.
Já chegou a última época da profecia de Cumas:
surge novamente a grande ordem da totalidade dos séculos.
A Virgem já está de volta, voltam os reinos de Saturno,
uma nova geração é enviada do alto do céu.
Tu, casta Lucina, favorece o menino que nasceu há pouco;
por causa dele, a época de ferro desaparecerá
e a geração de ouro surgirá no mundo. Apolo é quem reina agora.
Sendo tu, ó Polião, sendo tu o cônsul, a glória desta idade avançará,
e os grandes meses começarão a correr, sendo tu o chefe.
Se permanecem alguns vestígios de nossos crimes,
serão apagados e libertarão a terra de um pavor eterno.
Ele receberá a vida dos deuses e verá os heróis
misturados às divindades; ele próprio será visto entre elas
e regerá com as virtudes paternas o universo pacificado.
E para ti, criança, a terra produzirá, sem cultura alguma,
pequenos presentes: heras que vicejam aqui e ali como nardos,
colocásias misturadas ao alegre acanto.
As próprias cabrinhas trarão de volta ao lar os úberes retesados
de leite, e os rebanhos não temerão os grandes leões.
Os próprios berços produzirão para ti mimosas flores.
A serpente morrerá, e morrerá a erva enganadora do veneno;
O amomo assírio nascerá em toda parte.
E assim que puderes ler os louvores dos heróis
e os feitos de teus ancestrais, e saber o que é o valor,
aos poucos, o campo amarelará com espigas maduras,
as uvas vermelhas penderão dos espinhais incultos
e os rudes carvalhos destilarão úmidos méis.
Sobrarão, entretanto, alguns vestígios da maldade antiga,
capazes de ordenar que se afronte Tétis, com navios,
que se circundem as cidades com muros, que se abram sulcos na terra.
Haverá então outros Tífis e outra Argo que transportará
heróis escolhidos; e haverá também outras guerras
e mais uma vez um grande Aquiles será enviado a Tróia.
E então, quando a juventude já te tiver tornado um homem,
não só o comandante deixará o mar como também o pinho náutico
não mercadejará; a terra toda produzirá de tudo.
O solo não precisará suportar arados, nem as vinhas, foices;
e o labrador robusto desprenderá os jugos do touro;
a lã não aprenderá a imitar cores diversas:
o próprio carneiro, no prado, transformará seu velo
em púrpura vermelha ou em dourado açafrão;
o escarlate, espontaneamente, vestirá os cordeiros que pastam.
"Correi, séculos tais", disseram a seus fusos
as Parcas concordes com imutável desejo dos fados.
Ergue-te para as grandes honrarias - pois o tempo chegará -,
rebento querido dos Deuses, prole grandiosa de Júpiter.
Observa o universo oscilante em sua massa convexa,
as terras, as extensões do mar e o céu profundo.
Observa como tudo se alegra com o século que está por vir.
Que para mim se estenda a última parte de uma longa vida
e que o alento me seja suficiente para cantar teus feitos.
O trácio Orfeu não me venceria com suas canções
e Lino também não, embora a mãe assista àquele e o pai a este:
Calíope, a Orfeu; o formoso Apolo, a Lino.
Até mesmo Pã, se disputasse comigo, sendo a Arcádia o juiz,
até mesmo Pã, sendo a Arcádia o juiz, se declararia vencido.
Começa, pequena criança, a reconhecer tua mãe pelo sorriso
(os dez meses trouxeram longos incômodos a tua mãe);
começa, pequena criança: aquele a quem os pais não sorriram,
os Deuses não o consideram digno de sua mesa nem as Deusas de seu leito.


Tradução: Zélia de Almeida Cardoso ( NOVAK, M.L.& NERI, M.L.(org.) Poesia Lírica Latina. São Paulo: Martins Fontes. 2003)

Um comentário:

Unknown disse...

Na frase final, o entendimento é que os Deuses partilhavam da mesma mesa e as Deusas da mesma cama, já que os objetos são identificados no singular.