Nos braços maternais, nascido apenas,
Jazia Niterói, satúrnea prole,
Quando Mimas, seu pai, gigante enorme
Que ao céu com mão soberba arremessara
A flamígera Lemnos, arrancada
Dos mares no furor da guerra ímpia,
Tingiu de sangue as águas, salpicando
De seu cérebro o Ossa, o Olimpo e o Ótris,
Ferido pelo ferro com que Marte
Vingou de Jove a injúria em morte acerba.
Lamentando-se, Atlântida, apertava
Ao peito o filho, pálida, temendo
Trissulcos raios que inda acesos via.
Ouviu seu pranto o rei do argênteo lago
E o tenro infante, compassivo, acolhe.
No choque horrível, que dos Flegros Campos,
O mundo sobre os polos abalara,
Surgiram novas terras, novos mares,
Cobriram reinos, ilhas, cabos, brenhas.
Netuno aponta a plaga rica e vasta,
Do sepulcro do sol, erguida há pouco,
Inda mádida e nova, inda ignorada
Dos homens e do mundo; aqui se abriga
A estirpe ilustre, em Mimas profligada,
Que o justo e paternal intento herdara.
FONTE: ALVAREZ, Beethoven (edição, introdução, notas e posfácio). Niterói - Poema de Januário da Cunha Barbosa. Rio de Janeiro: Telha, 2023.