A competição (ágon) era um aspecto proeminente no mundo grego, e se manifestava em diversas esferas de sua sociedade: um exemplo está nos concursos de beleza, masculinos ou femininos. Alceu de Mitilene (fr. 130 L-P, v.13, 17-20) nos informa que esses concursos também faziam parte da vida religiosa, sendo provavelmente parte integrante de cultos à deusa Afrodite na ilha de Lesbos:
Lá, na terra consagrada aos deuses venturosos,
(...)
Onde as lésbias, sendo julgadas pela formosura,
vão e vêm arrastando os peplos, e em volta freme
o eco divino das mulheres,
o sagrado alarido das mulheres, ano a ano...
.].[...].[..]. μακάρων ἐς τέμ[ε]νος θέων
(...)
ὄππαι Λ[εσβί]αδες κριννόμεναι φύαν
πώλεντ' ἐλκεσίπεπλοι, περὶ δὲ βρέμει
ἄχω θεσπεσία γυναίκων
⸏ἴρα[ς ὀ]λολύγας ἐνιαυσίας
No entanto, um dos exemplos mais marcantes está no mito, no célebre julgamento de Páris. Na passagem abaixo da peça Troianas (v. 924-944) Eurípides apresenta Helena referindo-se ao episódio para o marido, Menelau:
E ele [Páris] julgou o trio de Deusas:
o presente de Palas para Alexandre era
se tornar general dos Frígios e destruir a Grécia;
Hera prometeu-lhe de Ásia e fronteiras de Europa
ser regente, se Páris a escolhesse.
Mas Cípris, espantada com minha formas
prometeu, se prevalecesse entre as Deusas,
dar a minha beleza. Daí, vê bem como segue a história:
Cípris vence as Deusas; e como as minhas núpcias
beneficiaram a Grécia! Não fostes dominados pelos Bárbaros,
na lança se impondo, ou por tirania.
No que a Grécia teve sorte, eu tive pranto;
vendida por minha beleza, sou censurada
por aqueles que deveriam coroar-me de louros!
Vais dizer que ainda não tratei do cerne da questão,
de como eu parti do teu palácio em segredo:
Não era deusa menor que veio com ele,
esse nume vingador, - queiras tu chamá-lo
de Alexandre ou de Páris – a quem,
grande infeliz, deixaste em teu palácio
e partiste num navio, de Esparta para o solo cretense.
ἔκρινε τρισσὸν ζεῦγος ὅδε τριῶν θεῶν·
καὶ Παλλάδος μὲν ἦν Ἀλεξάνδρωι δόσις
Φρυξὶ στρατηγοῦνθ' Ἑλλάδ' ἐξανιστάναι·
Ἥρα δ' ὑπέσχετ' Ἀσιάδ' Εὐρώπης θ' ὅρους
τυραννίδ' ἕξειν, εἴ σφε κρίνειεν Πάρις·
Κύπρις δὲ τοὐμὸν εἶδος ἐκπαγλουμένη
δώσειν ὑπέσχετ', εἰ θεὰς ὑπερδράμοι
κάλλει. τὸν ἔνθεν δ' ὡς ἔχει σκέψαι λόγον·
νικᾶι Κύπρις θεάς, καὶ τοσόνδ' οὑμοὶ γάμοι
ὤνησαν Ἑλλάδ'· οὐ κρατεῖσθ' ἐκ βαρβάρων,
οὔτ' ἐς δόρυ σταθέντες, οὐ τυραννίδι.
ἃ δ' εὐτύχησεν Ἑλλάς, ὠλόμην ἐγὼ
εὐμορφίαι πραθεῖσα, κὠνειδίζομαι
ἐξ ὧν ἐχρῆν με στέφανον ἐπὶ κάραι λαβεῖν.
οὔπω με φήσεις αὐτὰ τἀν ποσὶν λέγειν,
ὅπως ἀφώρμησ' ἐκ δόμων τῶν σῶν λάθραι.
ἦλθ' οὐχὶ μικρὰν θεὸν ἔχων αὑτοῦ μέτα
ὁ τῆσδ' ἀλάστωρ, εἴτ' Ἀλέξανδρον θέλεις
ὀνόματι προσφωνεῖν νιν εἴτε καὶ Πάριν·
ὅν, ὦ κάκιστε, σοῖσιν ἐν δόμοις λιπὼν
Σπάρτης ἀπῆρας νηὶ Κρησίαν χθόνα.
O mito do Julgamento de Páris torna-se um lugar-comum na poesia erótica, e são exemplos os dois epigramas (V.35; V.36) do poeta Rufino, abaixo citados. Pouco se sabe deste poeta a não ser pelos 38 epigramas de sua lavra conservados no Livro V da Antologia Palatina, o que levou alguns estudiosos (Paton, Stadtmüller) a crerem que ao menos uma porção deste livro seria proveniente de uma coleção organizada pelo próprio poeta. D.Page, em sua edição aos poemas de Rufino, argumenta que o poeta teria atuado, provavelmente, no século IV d.C.
Os poemas são uma paródia do julgamento de Páris: assim como as três deusas, as três competidoras também aparecem nuas para o poeta; e nesse sentido, o poeta expõe os critérios do que é desejável: o centro de interesse do poeta está nas partes ocultas da anatomia.
Rufino, V.35
as nádegas julguei de três moças: as próprias me escolheram
e me mostraram a fulgurante nudez de seus corpos.
A de uma, marcada por covinhas arredondadas,
florescia com alvura delicada.
Mas a de outra, quando abria as pernas, a nívea carne enrubescia
mais rubra que a rosa de cor púrpura;
a da terceira, mar sereno batido por tranquila onda,
balançava, tez macia, como que por vontade própria.
Se o juiz das deusas tivesse contemplado estas nádegas,
Nunca teria desejado ver as três primeiras.
Πυγὰς αὐτὸς ἔκρινα τριῶν· εἵλοντο γὰρ αὐταὶ
δείξασαι γυμνὴν ἀστεροπὴν μελέων.
καί ῥ' ἡ μὲν τροχαλοῖς σφραγιζομένη γελασίνοις
λευκῇ ἀπὸ γλουτῶν ἤνθεεν εὐαφίῃ·
τῆς δὲ διαιρομένης φοινίσσετο χιονέη σὰρξ
πορφυρέοιο ῥόδου μᾶλλον ἐρυθροτέρη·
ἡ δὲ γαληνιόωσα χαράσσετο κύματι κωφῷ,
αὐτομάτη τρυφερῷ χρωτὶ σαλευομένη.
εἰ ταύτας ὁ κριτὴς ὁ θεῶν ἐθεήσατο πυγάς,
οὐκέτ' ἂν οὐδ' ἐσιδεῖν ἤθελε τὰς προτέρας.
Rufino, V.36
Ródope, Mélite e Rodocleia disputaram entre si
qual das três tinha a melhor cona,
e me elegeram juiz. Assim como as deusas, admirabilíssimas
se puseram nuas, escorrendo em néctar;
E o meio das pernas de Ródope reluzia, raro,
qual roseira desfeita pelo sopro de Zéfiro [...]
[faltam dois versos.]
A de Rodocleia, igual cristal, úmida na frente
como estátua recém-esculpida em templo.
Mas, sabendo bem o que sofrera Páris pelo julgamento,
De pronto coroei as três deusas.
Ἤρισαν ἀλλήλαις Ῥοδόπη, Μελίτη, Ῥοδόκλεια,
τῶν τρισσῶν τίς ἔχει κρείσσονα μηριόνην,
καί με κριτὴν εἵλοντο· καὶ ὡς θεαὶ αἱ περίβλεπτοι
ἔστησαν γυμναί, νέκταρι λειβόμεναι.
καὶ Ῥοδόπης μὲν ἔλαμπε μέσος μηρῶν πολύτιμος
οἷα ῥοδὼν πολλῷ σχιζόμενος ζεφύρῳ ...
τῆς δὲ Ῥοδοκλείης ὑάλῳ ἴσος ὑγρομέτωπος
οἷα καὶ ἐν νηῷ πρωτογλυφὲς ξόανον.
ἀλλὰ σαφῶς, ἃ πέπονθε Πάρις διὰ τὴν κρίσιν, εἰδὼς
τὰς τρεῖς ἀθανάτας εὐθὺ συνεστεφάνουν.
[Traduções e comentários: Rafael Brunhara]